O casal Diva Depressão, formado por Edu Camargo e Fiih Oliveira, já levanta a bandeira da representatividade LGBT+ na internet, mesmo que de forma implícita, há mais de 10 anos. E tudo começou de maneira despretensiosa, pelo Facebook, quando Fiih criou uma página na rede social com memes sobre divas pop.
Hoje o casal, junto, tem mais de 1 milhão de seguidores no Instagram e mais de 3,2 milhões no Youtube, sua principal plataforma. Entre as diversas produções de impacto na internet, um dos programas mais aguardados pelos seguidores dos “meninos do Diva” é o reality “Corrida das Blogueiras”, que neste ano chega à quinta temporada, que já foi gravada e estreia no dia 7 de novembro.
“Neste ano o processo seletivo dos participantes foi um pouco mais longo, queríamos ter muita certeza sobre eles, foram várias entrevistas com a equipe. Nas temporadas passadas, eles [os participantes] já tinham o acompanhamento com o psicólogo durante o reality e a exibição dos episódios, mas neste ano a gente trouxe o psicólogo para a fase de seletivas também, para entendermos melhor os perfis”, diz Edu em entrevista exclusiva ao iG Queer.
“A cada ano que passa a gente consegue trazer uma galera com um nível muito alto e a gente até se surpreende que essa galera se inscreve no canal, que se interessa em estar no programa, porque a partir do momento que a gente abriu [as inscrições para criadores sem limites de seguidores, a gente recebe vídeos [de inscrição] de gente já muito grande na internet. Então, para nós também é sempre uma surpresa.”
Uma década de internet
Edu conta que nestes mais de 10 anos de estrada, o casal “nunca ficou fazendo a mesma coisa”. Primeiro veio a página no Facebook, depois de um tempo um blog, e os perfis no Instagram e no Twitter - agora X.
“A internet muda muito. Lá em 2012, quando a gente criou a página [no Facebook do 'Diva [Depressão]', já era um pouco assim também, as coisas já eram um pouco descartáveis, você aparecia ‘aqui’, e no outro dia já ‘sumia’. Muitas páginas que começaram com a gente, hoje em dia mal ouço falar delas, e acho ruim isso porque era uma galera que fazia uns memes legais, que produzia um conteúdo bacana.”
Depois de tentar diversas plataformas, o que Edu chama de “atirando para todos os lados e ocupando esses outros espaços”, o casal sentiu a necessidade de investir também em vídeos e daí surgiu a ideia de produzir conteúdo para o Youtube. “Mudou a nossa vida”, afirma o influenciador.
“O nosso 'casamento' com a Dia Estúdio deu muito certo porque eles também têm essa cultura de fazer coisas novas todos os anos”, diz o youtuber sobre o estúdio no qual o casal produz programas como o “Corrida das Blogueiras”.
“Eu enxergo a internet hoje como uma plataforma de constante mudança. A gente tenta acompanhar, mas óbvio que também escolhemos [em quais plataformas trabalhar].”
Processo de descoberta da sexualidade LGBT+
Assim como boa parte dos LGBTs, Edu também sofreu para expressar de forma pública sua sexualidade queer.
Ele conta que durante seu ensino fundamental, passou por uma série de episódios LGBTfóbicos .
“Eu sofri muito bullying porque já tinha um jeito mais afeminado, mas também não entendia direito [a sexualidade]”, afirma.
“Na pré- adolescência eu entendi que era gay, mas ainda não queria aceitar. Quando fui para o ensino médio, em uma escola pública, entre 2003 e 2004, eu convivi com todo tipo de gente. Eu não consegui me assumir logo de cara, mas consegui me sentir um pouco mais confortável em usar uma roupa diferente, prender o cabelo de um jeito diferente, de colocar um óculos”, conta o influenciador.
“Lá eu consegui me sentir um pouco mais livre, porque até mesmo os meninos mais héteros que andavam mais juntos, eles não mexiam com a gente, porque o ambiente era muito diverso”, complementa.
Vestuário queer
Hoje, Edu e Fih, como são carinhosamente chamados, expressam livremente suas identidades LGBTs na internet, o que tem impacto direto no vestuário que eles usam, que flerta com os gêneros masculino e feminino. O influenciador atribui essa característica ao reality de blogueiras que comanda com o marido.
“Nas duas primeiras temporadas [do 'Corrida das Blogueiras'] a gente ficou um pouco mais contido em termos de look. A gente se inspirava muito nos looks que o RuPaul vestia desmontado [no reality " RuPaul’s Drag Race "]. A partir da terceira temporada a gente pensou: ‘Podemos estar mais ousados, vamos usar umas roupas mais loucas”, diz. Edu complementa que as ideias partiram, principalmente, do stylist Dario Mittmann. “Foi ele quem trouxe essa roupagem, e a gente simplesmente embarcou.”
“‘Por que não estarmos maquiados já que a gente apresenta um reality de blogueiras’, pensamos. A gente trouxe equipe de cabelo, equipe de maquiagem, e a gente se jogou. No ‘Corrida 3’ uma chave virou na minha cabeça, eu comecei a acompanhar o dia a dia do Gabriel Jordan e do Weel Silva, que eram os meninos maquiados da temporada. Então, pensei: ‘Não é exatamente o que eu quero para mim no meu dia a dia, enquanto criador de conteúdo, mas eu também quero poder ser assim em alguns momentos’.”
“A gente não tem uma regra, mas, chegou o convite para um evento, a gente diz: ‘Vamos maquiados? Vamos fazer um look 'bafo'?’. A gente se sente mais livre, acho que essa é a palavra, a gente está mais livre para estar mais bicha, para estar mais montada ou estar mais de boyzinho, que até de boyzinho a gente está mais bicha também.”
O peso da representatividade
Com muitos anos de internet, de forma natural, as pessoas acabam se espelhando no casal e buscando referências para suas vidas, especialmente no que tange a representatividade que Edu e Fiih têm para a comunidade queer. Contudo, o youtuber afirma que não gosta de sentir o peso de ter que representar as pessoas.
“A gente senta ali e conta a nossa história, enquanto um casal gay, que já se f*deu muito lá atrás, e que hoje tem muitos privilégios. O feedback que a gente recebe é, por exemplo: ‘Eu sou gay e eu consigo assistir vocês com a minha mãe’. Já pararam a gente na porta de cinema, uma bichinha com a irmã, que nos falou: ‘Eu consegui me assumir para minha família, minha irmã me ajudou por causa de vocês, porque meus pais assistiram vocês e conseguiram entender que está tudo bem, que vocês vivem bem.”
Edu reconhece que o casal serve de exemplo para muitas pessoas que os acompanham, mas afirma que está longe de “querer representar todo mundo.”
“Eu acho que é um peso muito grande você se colocar como representante de uma comunidade. A gente está longe de ser um casal perfeito, a gente tem os nossos problemas, a gente tem as nossas brigas, a gente tem as nossas diferenças, então é uma vida de um casal comum. A gente tenta mostrar isso da forma mais natural possível.”
14 anos juntos (e contando…)
O casal está junto há mais de 14 anos, o que pode ser um exemplo de sucesso em uma relação afetiva LGBT+ para muitas pessoas da comunidade, contudo, Edu tenta trazer mais realismo para essa projeção e afirma que ele e Fiih têm “dias muito bons, fases muito boas e dias que a gente está brigando, dias que a gente não concorda.”
“Eu cresci numa família toda hétero, vendo os casamentos dos meus tios, e o nosso casamento é muito parecido [...] A gente ainda trabalha junto, então é um agravante. Você briga no meio do trabalho, vai cada um para um lado, porque hoje a casa é grande, mas precisa resolver o trabalho, o trabalho é nosso, então muitas vezes é difícil, mas eu acho que a terapia melhorou muito o nosso convívio. A gente também respeita muito o espaço um do outro.”
O influenciador ainda conta que recebe muitas mensagens de pessoas dizendo que o casal é uma “meta de relação” para elas, o que Edu vê com cautela: “Cada relação é uma relação, e eu acho que eu só tenho esse tempo todo de relacionamento porque é com o Felipe. Talvez se fosse uma outra pessoa diferente não teria durado tanto. É muito difícil.”
Ele continua: “A gente passou por um rompimento antes mesmo de começar com o Diva Depressão e ficamos quase cinco meses separados até a gente entender que realmente queria reatar. Fora esse rompimento, muitas vezes a gente brigou e pensou: ‘Vamos acabar com tudo, não dá mais’. Depois que a ‘poeira desce’, a gente vê que não era bem assim. A gente se ama.”
Madonna
Todes que acompanham o casal por anos sabem que ambos são fãs da rainha
Madonna, ícone para muitos LGBTs
, especialmente os que já passaram da casa dos 30 anos. Edu aproveita a entrevista para declarar seu amor pela diva pop.
“O que eu sempre falo é que a Madonna fazia o que ela fazia em um tempo em que falar de Aids e HIV , por exemplo, era um problema muito sério, o que ainda é. Ela é uma mulher muito transgressora”, elogia. “Eu acho que ela, em termos da sexualidade feminina, foi muito pioneira em abrir as portas para as outras mulheres poderem falar de sexo nas letras das músicas.”
“Para mim não tem uma diva pop que lutou pelas bichas como ela lutou, e como ela ainda fala pelas bichas. Principalmente quando essa coisa do HIV estourou, que a gente era muito estigmatizado lá no passado, e muitos dos nossos morreram por conta disso. Ela falava sobre isso nos shows dela”, declara Edu, que finaliza: “Não tinha internet, então a plataforma que ela tinha era o show.”
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