Cada vez que uma pessoa LGBTQIA+ brasileira se destaca no exterior é motivo de muito orgulho para a comunidade e, consequentemente, se torna uma referência para quem está por aqui. Fontana não tinha em quem se espelhar quando deixou a cidade de São Leopoldo, a 34 km de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul , há 10 anos, rumo a um novo destino em Estocolmo, na capital Suécia . Na época, ela foi viver um novo amor no país, o primeiro namorado, que acabou tempos depois, mas optou por continuar por lá.
Mais tarde, a gaúcha se encantou pelo universo drag queen, criou sua personagem com todo o “borogodó” brasileiro e começou a trabalhar em um país que mal sabia se expressar no idioma local, o sueco. Em entrevista exclusiva ao iG Queer , ela conta que não sabia nem dizer “oi” e que nunca tinha pensado em morar neste país, que é um pouco menor que o estado da Bahia.
“Sou uma mistura brasileira: nasci no Rio Grande do Sul, morei em Brasília e no Rio de Janeiro . Aos 19 anos vim morar na Suécia. Minha vida no Brasil estava muito difícil, eu vivia em um ambiente onde não poderia ser quem sou. Por uma questão de saúde mental, em um ápice de tristeza e depressão, larguei tudo e comecei minha vida do zero”, lembra.
Contudo sua vida teve uma grande transformação recente quando recebeu a notícia que foi selecionada para entrar na primeira temporada do “Drag Race Suécia”, reality da franquia “RuPaul’s Drag Race”, que também já tem outras versões no Canadá , Reino Unido , Espanha , Tailândia , Bélgica, entre outras, e futuramente também terá no Brasil . Ela diz que recebeu a notícia positiva quando estava no metrô e chegou a passar mal diante de uma notícia que pode mudar sua vida.
“Eu não esperava que fosse ser selecionado e, como imigrante na Suécia, estou muito acostumado a ver as portas se fechando para mim. Quando vi as inscrições de ‘Drag Race’ abertas, logo pensei que eles não me chamariam. Eu fiquei surpresa, era meu maior sonho, estava indo para o trabalho quando recebi a ligação. Eles enrolaram para falar, comentaram sobre o processo, eu já achava que não tinha passado e soltaram a bomba ‘você foi selecionada’. Eu comecei a tremer e chorar, quis até vomitar. Tive de sentar para respirar. Fiquei surtada, mesmo.”
Desde que o programa foi anunciado e a notícia chegou ao Brasil, o Instagram de Fontana tem recebido muitas mensagens de brasileiros, principalmente LGBTs, que contam suas histórias, sobre o sonho de ser drag queen, de entrar no reality, de morar no exterior e isso a deixou muito emocionada porque um dia também foi uma pessoa LGBTQIA+ no Brasil com muitos sonhos. A gaúcha afirma que nunca acreditou que um dia fosse conseguir superar os obstáculos para hoje ser uma drag do time de RuPaul.
“Meu pai estudou somente até a quarta série do ensino fundamental, minha mãe era solo, cuidava de dois filhos, auxiliar de enfermagem, trabalhava muito e ganhava pouco. A gente morava em uma casinha de madeira caindo aos pedaços. Fui a primeira pessoa do meu núcleo familiar a entrar numa universidade por meio de um programa do governo, o Prouni. Um dia eu era uma LGBT no Brasil sonhando e minha mensagem quando entrei no programa foi principalmente inspirar essas pessoas que, como eu, estão no Brasil sonhando. As coisas não são fáceis, mas tudo é possível”, exalta ela.
Inspiração
O reality show “RuPaul’s Drag Race” mudou completamente o cenário mais underground das drag queens quando entrou no ar pela primeira vez em 2009. Comandado e produzido por RuPaul Charles, o programa tem inspirado milhares de pessoas pelo mundo e criou personagens emblemáticas para a comunidade queer que hoje servem de referência para essas artistas. A primeira brasileira a participar do programa foi Miss Abby OMG, que ficou em 4º lugar no “Drag Race Holanda”, e Grag Queen também foi vencedora do “Queens of The Universe” , outro reality de disputa entre drag queens cantoras, que é da mesma produtora.
Fontana tem dificuldade para eleger quais são as suas queens favoritas entre as 15 temporadas do programa na versão original, norte-americana. Ela destaca que não costuma julgá-las quando assiste ao programa, pois entende perfeitamente as dificuldades que a profissão carrega.
“Só dessa gay colocar a peruca e dar o close, eu já estou batendo palma e já é uma grande inspiração pra mim”, diz. “Quando comecei a assistir, a primeira temporada que vi foi com a Raja (2ª), então eu tenho um lugar no meu coração para ela. É geminiana igual a mim, eu também amo a personalidade da Shangela , amo os conteúdos da Plastic Tiara. Também sou apaixonada pela Sasha Valour e as performances da Kennedy Davenport. Essa é rainha”, elenca.
Mas não são apenas as drag queens estrangeiras que encantam os olhos de Fontana. Ela confessa que sua maior inspiração é Pabllo Vittar , de quem é fã, e conta que as brasileiras são muito famosas por toda a Europa.
“A cena drag brasileira é muito famosa e elas reconhecem a potência global que é o Brasil. As queens daqui conhecem principalmente a Pabllo Vittar, que tem vários hits internacionais, já fez turnê internacional e o Instagram da Pabllo é referência para muitas queens daqui. Além disso, a nossa rainha do Universo, a Grag Queen, que venceu o programa que é da produtora da RuPaul, fez sucesso aqui. Na Suécia, eles amam as queens que cantam. Espero que minha participação no Drag Race faça com que mais drags brasileiras sejam reconhecidas aqui.”
Por fim, a gaúcha declara que está muito feliz por representar o Brasil no exterior e que pretende trazer a coroa para os brasileiros.
“Eu fico muito emocionada quando penso que sou a segunda brasileira a participar de Drag Race. O Brasil é tão grande, com muitos milhões de habitantes e sou a segunda a entrar para essa família de Drag Race. É uma honra imensurável”, finaliza.
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