As empresas podem ter um comitê de diversidade para ajudar a combater o preconceito
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As empresas podem ter um comitê de diversidade para ajudar a combater o preconceito

O ambiente social, cultural, econômico e político do país não está nada favorável para a promoção dos direitos LGBTI+. O ambiente político alimenta violências de todos os tipos contra pessoas LGBTI+, como que reagindo aos avanços conquistados nas últimas décadas pela sociedade civil.

Não estamos vivendo uma época de respeito à diversidade na sociedade e o governo Bolsonaro , mas não apenas ele, alimenta isso e deixa evidente em falas e práticas a todo momento. A violência contra pessoas LGBTI+ nos coloca entre os piores países do mundo neste tema, o que desafia as empresas a encontrar formas de atuar para erradicarmos a LGBTI+fobia a partir da maneira de ser, de fazer e de se relacionar.

Com a desigualdade é a mesma coisa. O que as empresas podem fazer? Gosto sempre de lembrar para o mundo empresarial que somos parte do problema e parte da solução. É preciso fortalecer nosso lado “parte da solução” por meio de ações concretas. As empresas podem investir, por exemplo, na inserção de pessoas LGBTI+ em práticas de desenvolvimento de profissionais para o mercado de trabalho, sobretudo pessoas trans. É uma ação social, um investimento social antes da pessoa estar na empresa, mas se há violência e desigualdade no país, porque as pessoas LGBTI+ não podem ser beneficiadas com essas iniciativas e investimentos?

Combater a LGBTI+fobia significa contribuir para que o país diminua os índices de violência e as desigualdades baseadas nos estereótipos, preconceitos e práticas de discriminação que geram exclusão no acesso a oportunidades iguais, vulnerabilidades, desvantagens concretas e simbólicas para as pessoas LGBTI+. É uma violência ter sua característica – ser uma pessoa LGBTI+, transformada em motivo para desigualdades.

Dentro do mercado de trabalho ou de cada empresa, grande ou pequeno, o enfrentamento das desigualdades e violências passa por gerar e fortalecer o senso de pertencimento, o que não pode acontecer quando pessoas LGBTI+, como outras minorias, se sentem “visita” e não parte integrante daquela comunidade dominada pela ideologia da cis-heteronormatividade.

O quesito LGBTI+ não está no censo do IBGE e nem nas delegacias dos bairros, o que prejudica que a sociedade conheça sua população LGBTI+, nossas necessidades, tenha políticas públicas que considerem nossa realidade e políticas que impactam o mundo privado também.

Há pouco ou nenhum investimento no treinamento ou desenvolvimento de profissionais das empresas no tema de diversidade, equidade e inclusão (DE&I), o que impacta a questão dos direitos LGBTI+. Quando acontece, é treinamento centrado para explicarmos apenas o significado de cada letra, sem avanços conceituais e práticos significativos, cheios de oportunidades para a própria empresa no relacionamento com seus diferentes públicos.

Novas gerações em geral e jovens LGBTI+ estão trazendo novos desafios para as empresas e nem sempre se sentem ouvidas. A estrutura de programas de diversidade nem sempre considera que há uma nova maneira das pessoas LGBTI+ se apresentarem, as fronteiras estão mais borradas e mais para uma definição queer do que identidades muito definidas, estáticas e inalteradas. Os grupos de afinidade oferecidos para essas novas gerações precisam ser repensados, como mostrou um estudo da Boston Consulting Group de 2020 (Uma nova força de trabalho LGBTQ chegou — culturas inclusivas devem seguir | BCG). A juventude LGBTI+ e não LGBTI+ é mais diversa, mais feminina, mais negra, muito diferente da geração de homens gays dos anos 90, quando foi definida a estratégia dos grupos de afinidade.

Como enfrentar a LGBTI+ se as estratégias de empresas que já possuem programas de diversidade e sistemas de governança do tema, como a criação de grupos de afinidade, que não estão sintonizadas com as novas gerações, suas demandas e contribuições?

Interseccionalidade é a palavra de ordem nos últimos anos, expressando o desafio que sempre esteve presente na valorização, promoção e gestão da diversidade: nenhuma pessoa deve ser reduzida a um dos seus marcadores identitários, a uma de suas características, por mais marcante que seja para ela ou para a sociedade onde vive porque somos isso e aquilo e muito mais. Dentro da própria comunidade LGBTI+ há uma pluralidade de características, perspectivas, contribuições e vivências da variedade de impactos da discriminação à diversidade sexual e de gênero. 

Quando empresas possuem grupos de afinidade para mulheres ou questões de gênero, incluem mulheres trans e lésbicas, por exemplo? Pessoas negras são consideradas e consideram, em seus grupos, pessoas LGBTI+ negras? As pessoas LGBTI+ com deficiência, com mais idade, as mais jovens, de diferentes religiões, regiões do país, classes sociais, entre tantas outras características, são consideradas nesta rica diversidade?

“Vagas afirmativas” são iniciativas das empresas que expressam compromisso com o cuidado da demografia em sua equipe de trabalho. É um avanço recente e com as boas parcerias, como a do TransEmpregos, focando em pessoas trans, o que envolve homens e mulheres trans e pessoas não binárias, algo que está crescendo nos últimos anos. Há empresas que não recorrem a essa estratégia de anunciar vagas para determinados públicos porque têm receio das ações afirmativas e temem que elas passem uma mensagem ruim para as "maiorias", que estão presentes em grande número. É mesmo uma boa preocupação que deve ser resolvida com um posicionamento da empresa que informe seus diferentes públicos e a sociedade em geral sobre suas intenções, compromissos e a pressa que tem para enfrentar a LGBTI+ e seus efeitos ruins para as pessoas, os negócios e a sociedade.

Os planos de ação das empresas para a questão LGBTI+ precisam melhorar. O quesito LGBTI+, pouco trabalhado pelas empresas no cadastro de pessoas candidatas às vagas ou já contratadas, dificulta avanços, mas não os impede a qualidade de planos com indicadores e acompanhamento das ações. Os 10 compromissos do Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+, do qual sou secretário, são públicos e ajudam bastante na elaboração de planos de ação consistentes, permanentes e que gerem impactos positivos nas estruturas e políticas das empresas, mesmo sem o número exato de pessoas LGBTI+ que há no mundo e dentro da empresa.

Benefícios e as estruturas em geral das empresas ainda resistem a acolher a diversidade sexual e de gênero, insistindo no binarismo de gênero, por exemplo, nos rituais, em estéticas e etiquetas cis-heteronormativa. Promover uma boa revisão das políticas em geral da empresa, suas estruturas, procedimentos, rituais, posturas, é uma forma de enfrentar a LGBTI+fobia que deixa tanta gente de fora. O que é feito para atrair e engajar talentos, como as empresas dizem, acaba servindo para dizer quem é desejado por elas e quem não é.

É preciso compartilhar práticas, portanto, valores, princípios, visões, entendimentos, aprendizados e desejos ou metas na cadeia de valor das empresas. Mesmo uma pequena empresa possui fornecedores, além de clientes, consumidores ou usuários. Está inserida em uma comunidade ou muitas comunidades, possibilitando que seu posicionamento contra a LGBTI+fobia seja divulgado e praticado no cotidiano.

Fazer a lição de casa é muito importante, mas ajudar o ambiente de negócios, por meio das nossas organizações, é essencial para acelerar o passo, conferir mais qualidade às ações e oferecer maior consistência. Sozinhas, as empresas não conseguem avançar. Você, que está lendo o artigo, o que pode fazer para que nossas empresas no país sejam parte da solução e não apenas do problema quando o tema é a erradicação da LGBTI+fobia?

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