Por muitos anos os fãs brasileiros de
“RuPaul’s Drag Race”
, a competição internacional de drag queens que ganhou o mundo, pediam à produção que o Brasil recebesse uma versão para chamar de sua, e finalmente RuPaul resolveu atender aos chamados.
Neste ano foi exibida a primeira temporada brasileira do famoso reality show e a grande vencedora foi Organzza, drag queen que é vivida pelo artista carioca Vinícius Andrade, de 31 anos. Em entrevista exclusiva ao iG Queer ele falou sobre o início da sua carreira no universo drag.
“Eu estudava direção teatral na UFRJ [Universidade Federal do Rio de Janeiro], e alguns amigos e veteranos meus participaram do ‘Queens, o Concurso’, que acontecia no TV Bar, em Copacabana [boate que fechou devido a pandemia da Covid-19]. Nessa época [em 2018] o concurso era transmitido por live, porque acontecia domingo à noite, e eu assisti algumas edições dessa forma.”
“Um amigo meu ia participar da 14ª edição e eu fui assisti-lo. Foi aí que comecei a frequentar o concurso. Depois dessa temporada teve outra que seria para drags iniciantes. Eu pensei: ‘E se eu participasse?’”, revela Organzza sobre o seu “despertar” drag.
Ela prossegue contando que na época estava em uma “relação meio conturbada” com o teatro e que viu naquela oportunidade “um lugar para estar no palco performando, sendo uma potência artística e criando cena.”
Nome drag
No “Drag Race Brasil”, Vinicius já havia revelado o porquê da escolha do nome Organzza para sua drag.
“É um nome de um tecido que pode ser fino, produzido por seda, muito caro, muito requintado, usado para vestidos de noivas, de baile, mas também um tecido sintético, altamente inflamável, muito utilizado no Carnaval. Esse tecido diz muito sobre a minha drag", comentou a queen durante sua apresentação no reality.
Contudo, antes de chegar no nome, Organzza revela que estava o procurando de uma outra forma. “Eu sempre quis um nome drag que tivesse uma relação com o Carnaval, com a costura e com o meu nome. Então eu procurei vários nomes de tecido que começassem com a letra ‘v’, porque eu queria que tivesse essa ligação”, diz ela se referindo ao nome Vinícius.
A drag continua: “Um dia eu estava costurando o meu primeiro look, e era de organza. Eu pensei: ‘Rodei, rodei, rodei e está aí. É isso. O nome me encontrou”. Quando perguntado sobre o que há de Vinícius na Organzza, o artista afirma que a drag é uma expressão artística sua. “É a criança viada. A minha criança viada hoje em cena”.
Relação com a costura
“Eu cresci com a minha avó [...] Eu cresci vendo a minha avó costurando, ajudando ela, auxiliando no que era possível, mas não efetivamente aprendi a costurar nessa época porque eu era uma criança. Eu aprendi a costurar por volta de 2011, quando eu tinha entre 18 e 19 anos”, revela Vinícius.
Ele continua: “No teatro eu sempre me envolvi muito com essa parte do figurino, essa parte estética das peças, mas eu costurava à mão, até então. Nessa época eu comecei a trabalhar efetivamente com figurino e a estudar, e entender as técnicas de costura. Mas só em 2016 que eu comprei minha primeira máquina.”
O artista conta uma história curiosa sobre o aparelho de costura. “A máquina ficou ruim e, inclusive, era de segunda mão. Minha mãe, então, consertou a máquina que era da minha avó que era de ferro e antiga, mas muito boa. Tenho ela até hoje, está guardada no meu armário. Com ela fui aprendendo sozinho [a costurar], de maneira autodidata, assim como tudo o que eu aprendi a fazer em drag.”
“Eu fazia minhas roupas e algumas perucas já que não tinha dinheiro para comprar peruca. Eu fazia muita coisa com perucas de Carnaval, essas do Saara [no Rio de Janeiro], que custavam 15, 20 reais. Eu já recebia muitas críticas, porque estava no auge das laces [perucas de alta qualidade]. O bafo era você ter a sua própria lace. Eu tinha a peruca de Carnaval mesmo, e isso não me fazia menos drag.”
Foi na pandemia que Organzza conseguiu aperfeiçoar seus talentos técnicos de figurino e maquiagem. “Fiquei quase um ano sem sair de casa e foi neste momento que eu comecei a testar e a treinar tudo. Comecei a entender como era se automaquiar. Ficava costurando igual uma maluca. Abria a caixinha de perguntas no Instagram e pedia: ‘Me diz um tema que eu vou fazer look’. Meu trabalho foi lapidado um pouco neste período.”
Cultura Ballroom
Antes de entrar no programa, Organzza já acumulava fama e prêmios na cena Ballroom do Rio de Janeiro. Ela compartilha como foi seu primeiro contato com a expressão artística.
“Eu sempre tive contato, de maneira muito passante, com pessoas que faziam parte da cultura Ballroom, já tinha ido a algumas balls. Eu era muito próxima das Irmãs Brasil, que fazem parte da mesma casa que eu faço parte hoje [Casa de Cosmes]. Em 2020, a gente gravou o clipe da Clarice Falcão, ‘Dia D’, e a partir disso, elas começaram a me incentivar a conhecer [a cultura Ballroom].”
“É muito importante a gente lembrar que o programa ‘Drag Race’ está muito pautado nos elementos da cultura Ballroom. O formato do programa, o desfile, a caminhada para servir o look em uma categoria, a batalha de lipsync, a bancada dos jurados”, reforça Organzza, que revela ainda que quase não se inscreveu no programa.
“Eu realmente quase não me inscrevi no programa, mas a minha mãe, que é alguém muito importante na minha caminhada desde criança, sempre fala que as coisas acontecem quando têm que acontecer, então era para acontecer e aconteceu.”
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