"Uma aberração aos olhos de Deus". Esse foi um dos comentários recebidos pela ativista de direitos humanos Paula Benett, após anunciar a pré-candidatura para a Câmara dos Deputados do Distrito Federal, na última sexta-feira, 18. A transexual filiada ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) compareceu à Delegacia Especial de Repressão Aos Crimes de Discriminação Racial, Religiosa ou Por Orientação Sexual (Decrin) nesta segunda-feira, 21, para denunciar os ataques sofridos.
"As pessoas atingem minha honra me chamando por pronomes de gênero masculino , utilizam de uma visão supostamente religiosa para me ferir. Eu esperava sofrer ataques, mas não dessa forma tão profunda", relata.
Ao visitar o perfil nas redes sociais do agressor, Paula percebeu um padrão nas ofensas: ele também fez publicações preconceituosas sobre Paulo Vaz, policial civil trans que morreu no último dia 15. Por serem grandes amigos, ela conta que chorou bastante durante o depoimento.
"É uma agressão póstuma, a agressão que quer fazer com que a gente desista, mas eu não vou desistir. Acabei de lancar minha candidatura e já está gerando crimes de ódio. É um ataque a mim, ao gênero feminino pouco representado na política e ao sistema eleitoral", desabafa.
Uma trajetória de dificuldade
Reconhecida como trans desde os 13 anos de idade, Paula conta que sempre foi objeto de muito preconceito. Mineira de Miraí, município com menos de quinze mil habitantes, ela diz que chegar ao mercado de trabalho não foi um caminho fácil.
"Me formei em Serviço Social com toda dificuldade, mas sempre pensei de forma coletiva. Eu sabia que existiam outras meninas como eu que não tiveram a chance de ir para escola. A maioria das trans está na prostituição", lamenta.
Sobre os papéis que foram impostos, ela destaca que a vida de programa ou o caminho da beleza eram os únicos em que ela era bem aceita. No entanto, Paula Benett diz que transgredir os limites foi o que a motivou a crescer.
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"Fui a primeira trans cordenadora de política do Distrito Federal, a primeira no Conselho da Mulher e servidora mais antiga de direitos humanos. Levei pedradas e entrei na politica para que mais meninas como eu pudessem estar nesses lugares também", afirma.
Este ano é a segunda vez que a assistente social disputa um cargo eletivo. Em 2018, Benett concorreu a uma vaga na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), mas não foi eleita. Desta vez, encara o desafio com confiança.
"Estamos cansadas de ter pessoas simpatizantes conosco. Elas são muito importantes e nos possibilitaram chegar mais longe, mas agora é nossa vez de falar por nós mesmas", diz, com entusiasmo.
Agenda
A assistente social diz que a pré-candidatura já é uma vitória. Caso seja eleita, ela pretende voltar seus esforços aos grupos marginalizados.
"Além da causa LGBTQIA+, luto também pelas pessoas com deficiência, indígenas, pessoas em situação de rua. Meu objetivo é símples, uma sociedade mais justa. Enxergo o povo na sua rica diversidade, respeito as necessidades de cada um.
Sobre o preconceito enfrentado, a pré-candidata é irredutível.
"Não posso ter o privilegio de ter medo, se não colocarmos o pé na porta, quando será?", finaliza.