33% dos brasileiros acreditam que peças publicitárias que mostram pessoas LGBT+ ajudam a mudar atitudes e preconceitos em relação à comunidade queer, segundo pesquisa da Teads
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33% dos brasileiros acreditam que peças publicitárias que mostram pessoas LGBT+ ajudam a mudar atitudes e preconceitos em relação à comunidade queer, segundo pesquisa da Teads

A comunidade LGBTQIAP+ , por muito tempo, foi representada de forma pejorativa nos meios de comunicação, especialmente em produtos audiovisuais, incluindo peças publicitárias. Parte dessa má representação tem relação com a forma como a sociedade entendia os integrantes da sigla, contudo, esta parece ser uma realidade que está mudando. 

Segundo o levantamento realizado pela Teads, 33% dos brasileiros acreditam que as publicidades que mostram pessoas LGBT+ ajudam a mudar atitudes e preconceitos em relação a este grupo –  resultado equivalente ao encontrado na primeira edição do estudo, realizado em 2022.

A pesquisa também revela que apenas 25% dos entrevistados têm visto com frequência campanhas de marcas que apoiam a comunidade, o que indica que, apesar de poder ser um importante motor de mudança, o setor ainda é pouco explorado para tal fim. Contudo, podemos perceber uma evolução neste tema, uma vez que, nos dados da pesquisa do ano passado, apenas 16% afirmaram acreditar que as marcas alinham suas campanhas à promoção de diversidade e inclusão.

Para Cau Stéfani, líder de Research & Insights da Teads no Brasil, diversidade sexual e equidade de gênero são "agendas importantíssimas na sociedade" que ainda não encontraram representatividade ideal nas ações do setor publicitário e nos posicionamentos das marcas. 

"A pesquisa revelou um cenário desafiador também no âmbito social. Observamos um ruído no entendimento da população. Há uma divisão quase exata entre a parte que acredita que campanhas que mostram pessoas LGBTQIAP+ ajudam a mudar atitudes e preconceitos, e a parcela que ainda se sente incomodada com essa exibição”, afirma a executiva se referindo aos 37% dos respondentes que afirmaram se sentirem incomodados com a publicidade que exibe pessoas queer, sendo a geração X, correspondente aos nascidos entre 1965 e 1981, a que mais demonstra desconforto (42%).

“Mesmo diante de um longo caminho a ser percorrido, é imprescindível que as marcas entendam a urgência desta pauta, contribuam de forma contínua para a causa e firmem compromissos reais de equidade e inclusão”, acrescenta Cau.

Eliziane Colares, sócia-diretora da Advance, uma agência independente de comunicação, explica que percebe que a discussão sobre inclusão e diversidade no meio publicitário “está cada vez mais forte” e que os clientes da agência se mostram “abertos às temáticas”.

“Já produzimos campanhas com mães de filhos trans, homens trans que geram filhos e casais homoafetivos. Além disso, as produções ganham desdobramentos, que vão das redes sociais, mídia on-line e tradicional”, afirma a executiva, que acrescenta: “Muitas vezes, a demanda de inclusão e diversidade parte do próprio cliente”.

Um dos clientes da agência é a rede de farmácias Pague Menos, que tem um podcast chamado "PodSempre". A produção, que também é exibida em vídeo no Youtube, já recebeu as influenciadoras trans Pepita e Bielo.





A empresária ainda comenta a recepção do público sobre peças publicitárias que abordam a temática da diversidade. Ela aproveita para fazer uma crítica à postura das pessoas no ambiente virtual: “As redes sociais são cheias de discursos diversos e, infelizmente, há preconceitos quando os materiais vão ao ar. Não só nas nossas produções com a temática [LGBT+], mas todo conteúdo on-line está à mercê desse tipo de ataque”.

Estratégias

Nas estratégias de mídia Eliziane explica que é possível trabalhar segmentações para evitar que o conteúdo seja veiculado em “vertentes de maior risco”, pautadas em conservadorismo  ou temas sensíveis.

“[O ideal é direcionar o conteúdo] para um público mais aberto, com maior preocupação em causas sociais e que tenham potencial de se identificar”, diz a especialista. “[...] colocando pessoas em espaços de normalidade, de forma que a narrativa não gire em torno de ser LGBTQIA+, mas que sejam pessoas com rotina comum e hábitos presentes na vida de qualquer brasileiro. A intenção não é chocar, mas trazer representatividade para grupos minoritários que já fazem parte da demografia brasileira”.

Sobre o cuidado em não realizar a produção publicitária com uso de estereótipos, a executiva afirma que a equipe da agência, quando se propõe a construir narrativas, pensa em protagonismo. 

“Esses protagonistas são autores de suas próprias histórias, com alegrias, desafios, realizações e todo o sentimento de essência humana  que esses personagens podem transferir para o público. Dessa maneira, normalizamos o ‘diferente’ e mostramos à sociedade novas formas de refletir sobre os modelos tradicionais.”

mulher com cores do arco íris pintadas no cabelo e no rosto
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Em uma pesquisa da iStock, cerca de 70% dos consumidores não LGBTQIA+ sentem-se melhor ao comprar produtos de empresas que apresentam pessoas queer em anúncios

A iStock, plataforma de comércio eletrônico que fornece conteúdo visual premium para profissionais e estudantes, revelou que as empresas continuam a usar imagens simbólicas e estereotipadas ao tentar demonstrar apoio à comunidade LGBTQIAP+.

Apenas 1% de todos os downloads de clientes de conteúdos no site da empresa em 2022 apresentavam representação LGBTQ+ e as bandeiras do arco-íris representavam 29% de todas as imagens usadas para representar a comunidade queer. 

Na pesquisa VisualGPS realizada pela empresa foi identificado que as pessoas estão procurando se envolver com marcas que celebram a diversidade.

Quase 70% dos consumidores não LGBTQIA+ sentem-se melhor ao comprar produtos de empresas que apresentam pessoas LGBTQIA+ em anúncios e 75% dos entrevistados que se identificam como não LGBTQIA+ afirmam que se sentem confortáveis com essa inclusão. 

“As pessoas reconhecem o poder da representação autêntica da comunidade LGBTQIA+ para impulsionar a mudança e a aceitação, e os consumidores estão abertos e aceitam as imagens, mas as empresas ainda não conseguem acertar”, diz Federico Roales, pesquisador criativo da iStock.

“No entanto, o futuro pode parecer melhor. 48% dos brasileiros em nossa pesquisa do VisualGPS afirmaram que acreditam que as pessoas serão amplamente aceitas, independentemente de como se identifiquem no futuro. As empresas, portanto, têm a oportunidade de mostrar sua aliança com a comunidade LGBTQIA+ com um marketing cuidadoso e inclusivo que se estende além do Mês do Orgulho.” 

Existem algumas perguntas simples que os donos de empresas podem fazer ao selecionar imagens e vídeos para garantir que reflitam melhor a experiência vivida pela comunidade LGBTQIA+, ajudando a construir uma melhor compreensão e aceitação demonstrando essa aliança durante todo o ano. O especialista traz três dicas:

  1. Em quais cenários as pessoas LGBTQIA+ são retratadas? A empresa as está exibindo no trabalho, em casa, na escola, viajando ou em outros ambientes sociais? Atualmente, 28% das imagens mostram pessoas LGBTQIA+ marchando/protestando, 27% em festas com arco-íris, apenas 14% mostram indivíduos LGBTQIA+ em um ambiente de negócios ou 14% como profissionais.

  2. A empresa só mostra pessoas LGBTQIA+ em histórias românticas ou como pais? E as pessoas LGBTQIA+ sem parceiros, vivendo vidas plenas? Atualmente, as pessoas LGBTQIA+ têm cinco vezes mais chances de serem retratadas com um parceiro romântico do que a população em geral.

  3. A empresa está mostrando pessoas LGBTQIA+ vivendo vidas positivas e satisfatórias, compartilhando experiências dentro e fora de suas comunidades? Com grupos de amigos de todas as identidades? Com uma variedade de estruturas familiares e com colegas? Atualmente, 30% dos homens gays são mostrados como afeminados e 28% como extravagantes, enquanto 29% das mulheres lésbicas são mostradas como masculinas, promovendo estereótipos contínuos.

Afetividades LGBTQIA+ anunciadas: olhares de famílias brasileiras

capa de livro
Divulgação

Capa do livro 'Afetividades LGBTQIA+ anunciadas: olhares de famílias brasileiras' de Francisco Leite

O pesquisador Francisco Leite da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), se dedicou a estudar no seu pós-doutorado perspectivas e práticas adotadas por famílias brasileiras homoafetivas e heteroafetivas quando estas se deparam, voluntária ou involuntariamente, com ações de marcas que comunicam de modo positivo expressões e representações das afetividades de pessoas LGBTQIA+ na mídia.

Na pesquisa, Francisco aponta que a maioria das famílias, tanto heteroafetivas quanto homoafetivas, "percebe os anúncios [com temática LGBT+] de modo muito positivo."

"Elas ressaltam que de forma inédita que essas peças publicitárias vêm contribuindo qualificadamente para a formação de memórias sobre as afetividades LGBTQIA+ no Brasil", afirma o acadêmico.

"Ao reconhecerem as potencialidades da publicidade para além dos seus objetivos mercadológicos, essas famílias também ressaltam que esses anúncios contraintuitivos [aqueles que violam as expectativas sociais] podem ser observados como importantes ferramentas para estimular, por exemplo, o início de conversas difíceis em seus lares, especialmente com as suas filhas e filhos, considerando a maturidade psicológica de cada criança e jovem, sobre diversidade, diferença e respeito."

Apesar de haver caminhos de intervenção que esses anúncios podem estimular na percepção social, "os desafios ainda são muitos para o alcance de resultados positivos", de acordo com o pesquisador.

"Ainda são poucas as produções publicitárias de anúncios com tais abordagens representativas. Há também a necessidade de ações de marcas mais autênticas, ou seja, que não pratiquem o rainbow washing - expressão usada para demarcar a apropriação das representações LGBTQIA+ como forma de autopromoção de marcas ou indivíduos não comprometidos autenticamente com o movimento de transformação social -, entre outras ações oportunistas", afirma Francisco.




O acadêmico pesquisa há mais de uma década questões acerca da anti-opressão e as possibilidades e caminhos para a inovação no uso de estereótipos na comunicação, pensando especialmente a ideia de publicidade contraintuitiva.

"São raras as pesquisas no Brasil, no campo da Comunicação, que se engajam progressivamente na exploração dessa temática, considerando especialmente os espaços da recepção midiática, isto é, são poucos os investigadores que vão ao campo para ouvir, dialogar e construir as suas pesquisas com as pessoas", critica o acadêmico.

"A maioria dos estudos vem focando na análise demarcada de anúncios [produção]. Desse modo, com o objetivo de contribuir com a superação dessa lacuna, eu desenvolvi essa pesquisa inédita no Brasil, da qual esse livro é fruto [...] Essa contribuição só foi possível pelo subsídio fundamental da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo", finaliza Francisco.

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