Mauro Sousa é um dos herdeiros de um dos maiores impérios do entretenimento brasileiro, a Turma da Mônica, onde ocupa um lugar de destaque como diretor de produção da Maurício de Sousa Produções desde fevereiro de 2010. Na empresa, ele tem a oportunidade de abrir espaço para os chamados “grupos minoritários” e abraça a diversidade étnico-racial, múltiplos estado de corpos, geracional, LGBTQIAPN+ e equidade de gênero.
O filho de Mauricio de Sousa é gay assumido, casado com Rafael Piccin, e abre a vida diariamente nas redes sociais sem medo de críticas quanto à sua sexualidade. Em entrevista exclusiva ao iG Queer, ele conta que o processo para se entender como um garoto homossexual foi extremamente delicado, complexo e muito solitário porque naquela época, na década de 1980, as referências que tinha na televisão de homens gays eram sempre de pessoas estereotipadas e alvo de piadas.
“LGBTs em geral eram sempre vistos com sentido muito pejorativo, uma piada, então para mim eu era aquilo: uma piada. Eu tinha vergonha de ser o que eu era. Por isso, inclusive, que eu espero ser um outro tipo de exemplo para as pessoas, para crianças LGBTs, justamente para que eles não passem pelo que eu passei.”
Mauro afirma que começou a se perceber “diferente” dos outros meninos quando tinha 10 anos de idade, mas foi somente aos 18 que teve coragem de conversar com a mãe, a também desenhista Alice Takeda, sobre esse assunto. Ele lembra que foi a mãe quem deu a iniciativa para iniciar uma conversa e que este foi um marco em sua vida.
“Ela falou que já sabia que eu era gay, que queria conviver com meu namorado, que me amava do mesmo jeito e foi o dia mais importante da minha vida. Porque foi a partir daquele momento que eu passei a existir. A minha mãe me deu essa possibilidade de existir sendo quem eu sou. Eu devo muito a ela”, enaltece.
Já o processo com o pai foi bem diferente: quem contou a Mauricio de Sousa foi Alice. O filho gosta de brincar que ela foi a “fofoqueira da família”, pois via tudo com muita naturalidade. Depois, em 2019, o próprio pai foi quem tirou o filho do armário de uma maneira muito natural, para que todos pudessem saber do orgulho que sentia.
“Ele quem abriu publicamente a minha orientação sexual. Ele postou uma foto no Instagram dele que era uma imagem minha com meu marido e a legenda dizia: ‘Eu, meu filho e meu genro’. Aí, essa foto repercutiu e foi para tudo quanto é canto, assim saí do armário pela segunda vez, agora publicamente”, lembra e ri da situação.
Hoje a relação da família é somente de afetos e o filho prodígio, que inspirou a criação do personagem Nimbus, afirma ao iG Queer que não sente nenhum tipo de rejeição dentro da família por conta de sua orientação sexual. “Eu nunca senti qualquer tipo de preconceito de ninguém na minha família. Eu sou uma pessoa muito privilegiada de realmente ter tido o acolhimento e o apoio de todo mundo”.
Vida de influencer
Somente no Instagram, Mauro coleciona mais de 277 mil seguidores e produz muito conteúdo com representatividade LGBTQIAPN+ e até mesmo alguns posts com ironias direcionadas àqueles internautas mais conservadores. Hoje ele conseguiu se consagrar não apenas como o profissional que trabalha na empresa criada pelo pai, mas também como um ícone dentro da comunidade.
“Virou um pilar importantíssimo na minha vida, um objetivo de falar cada vez mais sobre o assunto, de mostrar a minha rotina, meu lifestyle com meu marido, com a minha família, porque eu percebi que, com a visibilidade que eu e minha eles temos, a gente ajuda muita gente. Isso fez eu me sentir uma pessoa muito melhor”, declara. “Tenho seguidores mães, pais, filhos, jovens, crianças e todos vêm conversar comigo sobre esse assunto. Eu tento responder a todos, dar atenção ao máximo que eu posso e fico feliz que consigo ser uma possibilidade para todos eles, quem quer que seja”.
O problema é que neste caminho nem tudo são flores. Mauro já enfrentou e continua sempre encarando a ira daqueles que não aceitam que o mundo pode ser mais diverso e ter mais cores do que o tradicional preto e branco. Ele diz que já passou por um processo muito difícil de haters que o atacavam e de receber energia negativa por ter saído do armário publicamente.
“Eu não desejo esse episódio para ninguém. Mas isso sim me tornou uma pessoa muito mais consciente, muito mais forte diante da questão da sexualidade. Eu pretendo continuar para que, de repente, a gente transforme mais vidas da forma que eu percebo que a gente tem feito”, diz.
Personagem LGBT
Como diretor de produção na Mauricio de Sousa Produções, Mauro está habituado a receber uma cobrança de seu público sobre "quando a Turma da Mônica vai ter um personagem declaradamente LGBTQIAPN+?" O artista explica que tudo tem seu tempo e, dentro da empresa, foi criado um comitê de diversidade que trabalha a equidade ali dentro e o próximo passo será refletir isso também nos gibis.
“Tem de ser um posicionamento não meu, nem do Mauricio, mas da empresa, de todos. Então esse projeto vai vir como consequência desse trabalho que a gente tem feito para todas essas temáticas. É só agora a gente dar tempo ao tempo para colher os frutos desse trabalho que temos feito com mais estrutura. A diversidade e a inclusão sempre estiveram presentes desde as primeiras personagens criadas, mas agora temos realmente mais estrutura para que isso venha com muito mais embasamento e fundamento”, avisa.
Questionado se existe a possibilidade do próprio Nimbus se assumir um homem gay na versão jovem dos gibis da Turma da Mônica, Mauro não descarta a possibilidade.
“Por que não? Tudo é possível, afinal de contas, foi assim que aconteceu comigo: eu me descobri gay, tive consciência da minha sexualidade e acho tudo possível.”
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