Após receber a notícia de que fora excluído da programação do Mormaço Cultural 2023,
evento que está na 2ª edição e que ocorre em Boa Vista, capital de Roraima
, Johnny Hooker diz que ficou "devastado", ao mesmo tempo que precisou lidar com a perseguição de um público conservador.
Ao iG Queer , ele afirma que a extrema direita e os religiosos fundamentalistas sempre desenterram um vídeo, como uma forma de manipular as pessoas, em que o artista afirma que Jesus era uma pessoa queer .
Desde então, como consequência, ele é boicotado e tem sua manifestação artística censurada. "Eles querem ser donos de Deus, uma pessoa que foi das ruas", critica o cantor, que seria o único artista abertamente LGBT+ e de esquerda no evento, que ocorre entre os dias 26 de setembro a 1ª de outubro.
“É uma perseguição contra a população LGBT+. Eu, inclusive, era o único LGBT+ que faria parte da programação. E eles encontraram uma maneira de eu ser afastado.”
Por meio de suas redes sociais, o prefeito de Boa Vista, Arthur Henrique (MDB), publicou um vídeo para anunciar o cancelamento do show de Johnny. Entre os argumentos, o parlamentar usou termos como "respeito" e "segurança". Em nenhum momento do pronunciamento, o prefeito cita o nome do artista.
"Jesus é travesti"
Johnny afirma que o vídeo que causou a decisão do prefeito de Boa Vista em cancelar o show, que fora decidido pelo público previamente, foi postado no perfil do Instagram do deputado federal Antonio Carlos Nicoletti (União-RR), que resgatou a fala de 2018 do cantor e a tirou de contexto, segundo o artista.
Com a propagação do vídeo, Nicoletti incitou os conservadores que seguem ele a irem à página do prefeito de Boa Vista exigir que o artista fosse retirado do evento.
“Na postagem do deputado, ele afirma ainda que nos meus shows sempre há insultos e provocações contra a religião. Isso é mentira. Eles pegam aquele caso isolado, em que protestei a favor da minha amiga e atriz trans Renata Carvalho, e tentam difundir isso como algo frequente nos meus shows, mas, desde lá, eu nunca mais falei de religião nas minhas apresentações”, enfatizou o cantor.
Johnny enxerga na atitude do deputado federal, ao divulgar o vídeo, uma forma de atrair mais ódio à comunidade queer e construir uma base de eleitores para o próprio parlamentar.
“Se a extrema direita parar de distorcer as pautas LGBTQIAP+ , feministas e raciais, eles [os deputados do espectro político] não terão mais o que fazer para se manter por ser só o que têm a oferecer".
O vídeo usado para censurar Johnny foi gravado em julho de 2018, no Festival de Inverno de Garanhuns.
À época, o artista protestou contra a tentativa da prefeitura da cidade pernambucana de proibir a exibição da peça “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu”, estrelada pela atriz trans Renata Carvalho, que interpretou Jesus Cristo como uma mulher transgênero. Em sua manifestação, Johnny declarou: "Jesus é travesti sim, Jesus é transexual sim, Jesus é bicha, p*rra."
O artista afirma que o prefeito de Boa Vista agiu sem analisar o caso de maneira crítica, cedendo apenas à pressão dos fundamentalistas e conservadores.
“Ele não considerou a vontade da própria população LGBT+ de Roraima que votou para eu estar lá. As pessoas que pediram para eu ir, são as pessoas que frequentam o festival. Já as que começaram a pedir para eu ser retirado, são apenas religiosos conservadores que não sabem lidar com as diferenças”. Johnny faria apresentação em Boa Vista no sábado (30), com show em homenagem a Marília Mendonça.
Cantor chegou a ser denunciado, mas foi inocentado
O cantor também defende que as pessoas que pediram pela retirada dele do festival “apenas viram uma oportunidade de despejar o fanatismo religioso sobre uma situação que, inclusive, já foi anulada pela Justiça”.
O caso em que ele afirma ter sido inocentado foi quando, em 2018, o advogado Jethro Silva Júnior entrou com uma notícia-crime, no Recife (PE), pedindo a prisão preventiva do artista, contudo, Johnny conseguiu provar sua inocência.
“O Estado é laico, e isso todos já sabem. Se uma pessoa na política ceder apenas às pressões religiosas, e não buscar ouvir outros grupos, sem saber lidar com as diferenças, ela não deveria estar ocupando esse cargo.”
Johnny afirma que está recebendo o apoio da equipe jurídica da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e que tomará algumas medidas judiciais contra o prefeito de Boa Vista e o deputado Nicoletti, entre elas, acionar o Ministério Público de Roraima para que o prefeito seja responsabilizado pelo crime de homotransfobia e pelo ato de censura artística aplicado.
“Estamos no processo de protocolar uma notícia-crime contra a prefeitura, o prefeito e contra o deputado Nicoletti, pelos crimes de calúnia, censura, difamação, ataques de ódio e LGBTfobia ”.
Na trajetória enquanto artista, este não foi o primeiro boicote que Johnny sofreu. Em 2018, ele criticou também o cancelamento do seu show na 17ª Parada da Diversidade de Teresina (PI). O cantor, que seria atração principal do evento, foi substituído por Pabllo Vittar após ter sofrido ameaças por conta da mesma fala que o fez ser retirado do festival em Boa Vista.
Procurada pelo iG Queer para novas explicações , a prefeitura de Boa Vista não se manifestou até a publicação do texto. O espaço segue aberto.
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