
A comediante Bruna Braga viajou a Portugal com diversas malas cheias de looks e uma língua afiada para compor o segundo ano de Drag Race Brasil . A humorista fez parte do painel de jurades fixos do programa em 2023 e retornou ao lado da host Grag Queen e de Dudu Berthollini para julgar as dez novas participantes da nova temporada da franquia brasileira do programa.
Em entrevista exclusiva ao iG Queer, Bruna afirmou que a pressão em torno da segunda temporada de Drag Race Brasil , que estreia no dia 10 de julho, na WOW Present Plus , deu lugar à expectativa e à confiança do público. A jurada explicou que o programa volta mais amadurecido, com um elenco mais preparado e uma equipe ainda mais entrosada.
A primeira temporada estreou em 2023, após mais de uma década de espera por uma versão brasileira da franquia, e trouxe visibilidade para a cena drag nacional.
" A pressão da segunda temporada vem de outro lugar. O público agora quer que o jogo aconteça, quer sonhar junto. Não é mais aquela cobrança de ser igual às versões internacionais ", afirmou Bruna. A artista também comentou os ataques que sofreu online, a importância da diversidade regional e como isso se relaciona com a estrutura elitista ainda presente em parte do público LGBTQIAPN+.

“Sempre fui a anti-heroína”
Bruna Braga contou que a rejeição já fazia parte de sua trajetória antes mesmo da televisão. “ Eu sou comediante stand-up, venho de um meio majoritariamente masculino, branco, hétero, cis ”, apontou. “Sempre fui a persona non grata, a anti-heroína do meu próprio meio.” Segundo ela, o hate começou antes mesmo da confirmação oficial como jurada do reality. “ Desde que fui rumorizada, comecei a sofrer hate. Já esperava desde o convite. ”
O ódio nas redes sociais ganhou contornos inesperados, atingindo inclusive pessoas próximas a ela.
“ Comecei a perceber pessoas que eu admirava entrando nesse lugar também. Como se não me conhecessem mais. Como se não tivessem me mandado mensagens dizendo: ‘Você é foda, nunca deixe te dizerem o contrário’. ”
Bruna analisa que a rejeição não é só pessoal, mas também política.
“ Virou cool não gostar de mim. Como se gostar de mim não fosse hype. Eu não sou do nicho de luxo. Faço comédia para as senhorinhas do sofá, para as bichas que nunca foram à boate, para as do sertão. ”
Ela associou os ataques à elitização da cena queer .
“ As pessoas acham que o Brasil é só o Sudeste. Questionaram meu sotaque, minha forma de falar. Mas eu fui criada no sertão da Bahia. Tenho uma mistura legítima. ”
A artista ainda destacou como se sente mais próxima das queens do que da bancada internacional. " Estou muito mais próxima das queens do que de uma Michelle Visage. Financeiramente e como artista, sou uma delas ."
Bruna reforçou que seu papel como jurada parte dessa vivência marginalizada.
“ Não sou uma estrela que chegou no topo e agora avalia as outras. Eu ralo como todo mundo. Então minha visão também é a de alguém que está lutando. ”
Para ela, a posição de jurada é uma forma de devolver à comunidade parte do espaço que conquistou. “ Eu também sou uma das nossas. Só tô sentada numa outra cadeira agora .”
Ela ainda criticou a forma como o humorista Leo Lins, condenado a 8 anos de prisão por discurso de ódio em um show, tem sido abraçado por parte do público enquanto artistas LGBTQIAPN+ enfrentam cancelamentos e perseguições.
" Leo Lins está enchendo o bolso de dinheiro rindo da nossa dor, enquanto a gente continua fazendo show por R$ 300. Só a gente tá perdendo. A cena precisa acordar. Não é por mim, é por todo mundo ", afirmou.

Saúde mental e resistência
Em meio à emoção de de encarar um novo desafio, somada à expectativa do público, Bruna revelou que convive com depressão e transtorno de personalidade borderline.
“ Sou um combo de coisas que não posso fingir que não acontece, mas vivo bem. Consigo ser funcional .”
Ela reconheceu que os ataques afetaram emocionalmente, especialmente na reta final da primeira temporada.
“ Me machucou muito ver pessoas sendo tão baixas. Eu já estava passando por um processo de descobrir um problema de saúde. ”
Mesmo assim, afirma que hoje está mais preparada.
“É muito difícil alguém me abalar com o que fala. Tenho muita certeza do que faço, não só no Drag Race, mas na vida .” Com humor, rebateu a percepção pública de que estaria mal. “ Postei no Twitter: estou dançando louca de Aperol e alguém diz ‘não liga pros haters’. Amor, eu só tô bêbada .”
Ela também refletiu sobre a marginalização dentro da própria cena. " O Drag Race veio para ensinar que precisamos reverter nossa dor para nós. Ser uma família. Senão a gente vai morrer se apunhalando e se apedrejando. "
Para Bruna, o fortalecimento coletivo é essencial. “ A gente continua fazendo show por R$ 300 enquanto o outro lado tá enchendo o bolso de dinheiro rindo da nossa desunião .”
A huorista também afirmou que sua força hoje vem do autoconhecimento.
“ Quando não tô bem, eu sumo da internet. Mas quando apareço, é porque estou bem de verdade .” Ela ainda ironizou: “ Pra me abalar hoje, tem que vir de bazuca. Com medo e xingamento, amor, não vai me abalar. Tô bonita, tô empoderada, tô com a minha pomba gira sentada no terreiro. ”

Relação com as queens
Na primeira temporada, Bruna não conhecia pessoalmente nenhuma das participantes.
“ Depois do programa, viramos uma família. A gente se fala, manda parabéns, vai no bar .” Ela destacou que as queens foram essenciais para seu aprendizado. “ Elas sempre serão lembradas como as pioneiras. Foram minhas professoras. Me treinaram .”
Com a nova temporada, algumas amizades já existiam.
“ Conhecia o trabalho de todas, algumas pessoalmente. Isso não interfere no julgamento. Se tiver que falar que tá feia, vou falar .” Para ela, o vínculo emocional não atrapalha a avaliação técnica. “ Se não tá preparada pra ser julgada, nem devia se inscrever .”
Sobre a recepção do público, afirmou.
“O público sabe que posso estar diante de uma amiga, mas não deixo de ser justa.” Ela contou ainda que viveu intensamente a primeira temporada, indo a festas, surpresas em watch parties e criando laços pelo Brasil. “É muito doido encontrar uma amiga e saber que ela tá realizando um sonho. Mas isso não anula meu papel como jurada.”
Bruna acrescentou que sua conexão com o universo drag se fortaleceu após a primeira temporada.
“ Hoje é difícil ter uma temporada em que eu não conheça alguém. Eu virei parte dessa cena, fiz amizade com drags do Brasil inteiro .” Ela acredita que isso dá ainda mais responsabilidade à sua posição. “ Eu não tô de fora olhando. Tô dentro, ouvindo e sentindo junto. ”

“Não vou sair desse programa sem estar casada”
Bruna destacou o look do primeiro episódio como o mais importante.
“ É uma homenagem ao palhaço Chamego, a primeira palhaça negra do Brasil registrada. ” Ela explicou que a escolha dialoga com sua própria trajetória. “ Referenciar a ancestralidade da palhaçaria é muito significativo. É uma arte sobre mudar realidades .”
O figurino foi desenvolvido por Vitor Belchior com styling de Leonor.
“ Eles criaram o look com base no conceito que eu tinha do Chamego. Tem a Bruna ali também. ” Para ela, o palhaço é uma figura de resistência. “ O palhaço quer agradar quem tem olho pra ele, quem enxerga. Isso diz muito sobre mim. ”
Bruna garantiu que está confiante com os visuais da temporada.
“ Tô incrivelmente gostosa em todos os episódios. Quem me odeia vai passar mal, mas não vai poder me chamar de feia. ” E ainda brincou sobre o impacto de seus figurinos. “ Eu não vou sair desse programa sem estar casada .”
Ela ainda comentou a diferença de estilo entre as temporadas.
“ Na primeira, eu tava mais camp, mais circense. Agora, continuo sendo eu, mas com mais assertividade no que quero dizer com a roupa. ” Para ela, o figurino também comunica sua evolução. “ Cada look é uma declaração .”
Desafios e elenco
Sobre as participantes, Bruna só tem elogios principalmente com relação ao desempenho delas.
“ A temporada está absurdamente maluca de qualidade. Elas vieram torando .”
Segundo ela, os desafios ganharam nova força. “ O Snatch Game tá absurdo. Foi quase unânime. Todo mundo acertou .” Ela também destacou o desafio de roast . “ Elas tiveram aulas e passaram no Enem. Foi um show. ”
Sobre a dinâmica entre as participantes, foi direta: “ Pacífica só a água do oceano. Tudo maluca. Mas funcionam como elenco .” Para Bruna, a escolha do elenco foi acertada. “ Cada uma brilha à sua maneira. Não teve ninguém de canto. É uma temporada vibrante .”
Ela destacou ainda que o contraste de personalidades fortalece o formato. “É tudo muito complementar. As diferenças geram enredo .” Para Bruna, a diversidade é o que move a temporada. “ Cada uma entrega algo único. E juntas, fazem o programa acontecer .”
Bruna também elogiou o entrosamento da equipe por trás das câmeras. “ A produção tá mais alinhada, mais madura. Todo mundo sabia o que queria fazer .” Segundo ela, isso ajudou a elevar o nível da competição. “ Quando a estrutura melhora, as queens conseguem se entregar ainda mais. ”

Bate-bola com Bruna Braga
Três palavras para definir a temporada: “ Generosidade, talento, entretenimento. ”
Uma ave do paraíso: “ Urubu .”
Celebridade que gostaria de ver no Snatch Game: “ Nicole Bahls .”
Música brasileira que o mundo precisa ver sendo dublada: “ Hoje à noite, Calcinha Preta .”
O que a drag brasileira tem que o mundo precisa descobrir: “ O dendê. ”