Falta de capacitação adequada de profissionais impacta na experiência de pessoas trans em ambientes de saúde
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Falta de capacitação adequada de profissionais impacta na experiência de pessoas trans em ambientes de saúde

Em junho foi celebrado o Mês do Orgulho, um período importante do ano para discussões voltadas para o avanço de diverso temas ligados à comunidade LGBTQIAPN+. Dentre eles, a diversidade na saúde requer uma maior atenção, seja no desenvolvimento de estudo clínicos, na promoção de acesso equitativo para esta população ou na atuação dos profissionais de saúde.

“Ao longo dos anos, avançamos nestes debates, mas ainda temos um longo caminho a percorrer para promovermos, de fato, um ambiente acolhedor para pacientes e profissionais, com saúde integrada independente do gênero, identidade e orientação sexual”, diz o biólogo e imunologista Estevam Baldon.

De acordo com Estevam, quando se trata de pesquisa clínica, é possível perceber uma escassez de estudos que abordem as necessidades específicas dessa comunidade. “Estruturas tradicionais para a realização de estudos podem criar barreiras para esta análise”, diz o profissional, que exemplifica: “Os documentos de consentimento e os dados coletados geralmente são projetados de forma que não atendem às necessidades e aos dados demográficos específicos da população LGBTQIAPN+, principalmente quando falamos de grupos minorizados dentro da própria comunidade.”

O biólogo afirma que é preciso romper essa barreira. “No ano passado, iniciamos aqui no Brasil um estudo específico sobre a prevalência de HPV na população transgênero, dado ainda pouco estudado e que pode ter um impacto na definição de políticas de saúde muito importantes.”

Estevam destaca que a pesquisa visa jogar luz aos problemas enfrentados tanto no acesso à prevenção e detecção precoce, a fim de ter recursos mais bem direcionados para evitar possíveis casos de câncer diretamente relacionados às lesões persistentes causadas pelo vírus.

“Incluir identidade de gênero e orientação sexual nos rastreamentos realizados por entidades públicas, respeitando as normas da LGPD, é um caminho para maior visibilidade de questões de saúde da população LGBTQIAPN+ e todas as suas interseccionalidades. Tais informações permitem o mapeamento de doenças, condições e fatores de risco que podem ser expressivos para essa comunidade e que permanecem desconhecidos. Mais ainda, traria a oportunidade de entender a diferença na eficácia em tratamentos e intervenções, para abordagens mais individualizadas”, diz ele.

O imunologista destaca que a inserção de pessoas LGBTQIAPN+ é importante em todos os lugares, e isso inclui também a indústria farmacêutica.

“Como homem gay cisgênero, e envolvido em discussões da comunidade, a participação dentro das estratégias são fundamentais para trazer temas que são negligenciados pelo desconhecimento de pessoas que não são da comunidade”, explica. “Um exemplo é a inserção de profissionais da saúde LGBTQIAPN+ em palestras e eventos para tratar sobre o tema, ou mesmo a criação de estudos clínicos com um olhar mais focado na comunidade.”

Segundo ele, é necessário quebrar tabus e estereótipos ligados à comunidade ao longo dos anos. “Precisamos incentivar tanto o autocuidado na busca de consultas de rotina, acompanhamento do calendário vacinal, como a preparação dos profissionais da saúde para o acolhimento e a escuta de cada paciente que procurem atendimento. Dessa forma, melhoraremos os indicadores, o rastreamento de diversas doenças e a conscientização com foco neste público.”

Estevam, que gerente médico da MSD, menciona ainda a atuação da classe médica no cuidado destes pacientes, especialmente em relação à população transgênero.

“É preciso que haja direcionamento correto para especialistas, considerando as características de cada paciente e os cuidados preventivos de forma individualizada. Essa abordagem deve ser sensível e liberta de possíveis tabus e constrangimentos, com preparo dos profissionais para que façam perguntam relevantes e possam, assim, oferecer o melhor atendimento possível.”

Ele destaca ainda que ter profissionais médicos LGBTQIAPN+ liderando esse letramento sobre a abordagem ao paciente também é de extrema importância, já que estes “vivem na pele” as dificuldades que a comunidade enfrenta cotidianamente.

“O fato é que a negligência dos grupos minorizados gera riscos consideráveis em todos os aspectos de suas vidas, incluindo o essencial, que é a saúde. É importante que haja o interesse de todos em promover a inclusão e a equidade de acesso para a comunidade LGBTQIAPN+, de forma direcionada e especializada, com dados e informações relevantes, para, assim, garantir ações de saúde individual ou coletiva que objetivem melhor qualidade de vida a essa população”, finaliza.

Estevam Baldon no 35º congresso internacional de combate ao HPV, em 2023 Reprodução/Instagram
Estevam Baldon no 35º congresso internacional de combate ao HPV, em 2023 Reprodução/Instagram


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