Entre os conflitos que rondam a mente e a vivência de pessoas LGBTQIAP+, as experiências sexuais podem ser destacadas principalmente se levado em consideração que o envolvimento interpessoal dessa população – de modo sexual ou romântico – é por si só visto com maus olhos devido à LGBTfobia. Em meio a isso, surgem os tabus da “primeira vez”, quando se começa a desenvolver o contato sexual e mais íntimo com outras pessoas.
Se tratando de pessoas LGBTQIAP+, as dúvidas e os temores ao redor desse tema podem se intensificar, como explica a sexóloga holística Virginia Gaia. “O tabu da virgindade ainda está muito relacionado ao ideário cristão, o que torna toda a sexualidade algo cheio de culpa e mais difícil de lidar. Com o público LGBT há ainda o complicador da heteronormatividade que assombra a cultura contemporânea, ainda que tenhamos avançado muito nos últimos anos”, explica. “Não que as pessoas LGBT sejam mais complicadas que a média dos heterossexuais. Não é isso. Mas o fato é que, como ainda há muitos preconceitos, lidar com a sexualidade passa a ser mais problemático por conta do fator social”.
Ao ser questionada pelo iG Queer sobre os principais tabus e desinformações, a especialista pontua principalmente a crença de que a virgindade é maculada apenas quando ocorre penetração e reitera o motivo principal pelo qual pessoas LGBT podem enfrentar mais conflitos com relação a isso.
“Primeiro, a ideia de ‘virgindade’ ainda pressupõe hímen e uma penetração peniana no canal vaginal. Essa associação está completamente equivocada, até mesmo entre os heterossexuais, pois a questão da ‘primeira vez’ representar um ‘rito de iniciação’ independentemente de qualquer tipo de penetração ou não, acaba ficando em segundo plano, quando deveria ser o contrário. Com o público LGBT há o complicador de a ‘primeira vez’ representar algo que a sociedade ainda discrimina”, expõe.
Leia Também
Ser considerada um “rito de passagem” pode fazer com que a perda da virgindade seja reverberada de diferentes maneiras nos meios sociais aos quais a pessoa LGBT está inserida, principalmente na roda de amigos na qual o assunto costuma circular e pode ser abordado de maneira pouco saudável. É isso que comenta o psicanalista Gregor Osipoff:
“A primeira vez já é uma pressão por si só, e quando somada às questões culturais e as amizades, pode-se potencializar a ansiedade. Até para pensar qual seria o momento ideal, se é o que se quer, ou se é uma escolha dos outros. Muitas vezes as amizades podem induzir a escolhas não muito legais, por isso em qualquer uma destas situações é importante o respeito, individualidade, e entender realmente a finalidade e o quanto esse momento faz sentido. As expectativas são suas, não deixe que outros falem o dia e como terá que ser. Sim, é um rito de passagem para toda a sociedade, principalmente na aceitação da sua sexualidade, na escolha da companhia, na expectativa, até da ansiedade da performance que pode gerar cenários imaginativos de um momento realmente especial”, diz.
Leia Também
Ele acrescenta ainda que a insegurança, apesar de natural quando se trata da primeira vez, pode ser intensificada quando a pessoa não se sente totalmente segura ou preparada, logo este é um ponto que merece atenção.
“Antes de qualquer ação, na direção à sua primeira vez, deve-se pensar bastante sobre sua escolha, sobre a própria sexualidade e das implicações relacionadas à própria saúde. A insegurança é do momento por ele próprio, mas se acentua quando a pessoa não está segura quanto ao caminho que está percorrendo, aumentando e muito essa sensação [insegurança]. Em muitos casos isso pode ser potencializado por medo da cobrança social, assim como também a dificuldade de autoaceitação. Não podemos ser vítimas do próprio amor, por isso a escolha é fundamental, do tempo, do local e dos detalhes, e isso feito de forma consciente vai dar a força necessária para que seja especial como sonhado”, explica.
Ainda de acordo com o especialista, “um ponto inicial e querer, que dá a confiança para este momento que sempre é desconhecido para cada pessoa, as reações e expectativas são nossas e como isso quanto mais seguro estiver quanto as suas escolhas, menos tenso será”.
Virgínia ainda comenta que o fato da primeira vez representar uma espécie de rito de passagem não é algo ruim isoladamente, mas quando há pressões externas, pode se tornar um problema. Além disso, a sexóloga ressalta ainda a importância de proteger-se durante o ato e realizar sexo seguro.
“O problema é quando existe pressão para isso, seja dos amigos, do parceiro (a) ou da sociedade em geral. O ideal é que a pessoa veja esse momento como algo muito importante para ela mesma e para o parceiro (a), sem ter o peso de terceiros nesse momento. O principal erro é fazer algo em função de pressões externas, arriscando a saúde física e emocional. As precauções são as de sempre: não deixar de usar o preservativo (masculino ou feminino) e não compartilhar brinquedos sexuais sem a devida proteção”, pontua.
Para que todos os conflitos já citados possam ser pelo menos parcialmente evitados, Gregor chama a atenção para a importância de investir em educação sexual nas escolas. “Ela é fundamental para o desenvolvimento saudável, pois nestes momentos pode-se tirar dúvidas que possivelmente vão gerar ansiedade no futuro. Toda informação poderá dar um segurança a este momento, para principalmente se preservar nas questões de saúde física e mental”, conclui.
Agora você pode acompanhar as notícias do iG Queer também no Telegram! Clique no link e entre no grupo .