Danilo Tupinikim é militante pelos direitos LGBTQIA+ e indígenas.
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Danilo Tupinikim é militante pelos direitos LGBTQIA+ e indígenas.

Danilo é indígena do povo Tupinikim e cofundador do coletivo Tibira, que tem como principal objetivo levar informações sobre temas relacionados à sexualidade, promovendo debates e conscientização. Segundo ele, a questão LGBTQIA+ entre os povos indígenas se difere de uma cultura para outra. 

“A questão LGBT+ dentro das comunidades indígenas é bem diversa, depende do povo e dos impactos causados que a colonização trouxe para dentro de cada um. Dentro das comunidades do meu povo não foi diferente, nós fomos um dos primeiros povos atingidos pelo processo de colonização e este processo fez com que a imposição da cultura ocidental atingisse de forma negativa em nossas comunidades”, explica. 


O jovem, que também é estudante de Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB), destaca que existe uma diversidade cultural entre os povos indígenas brasileiros, e por isso a visão de sexualidade varia de acordo com o povo. Danilo afirma que em muitos grupos a diversidade sexual é, ou costumava ser, considerada como parte da cultura ou até mesmo como uma divindade.

“Dentro do meu povo eu não posso afirmar que em séculos passados tinham as relações homoafetivas como parte de nossa cultura ou não, mas em minha realidade enquanto um indígena e gay, passei por diversas situações de homofobia desde a minha infância, mesmo sem eu mesmo entender sobre questões de gênero e sexualidade. Assim como no contexto da sociedade não indígena, muitos corpos LGBTQIA+ sofrem antecipadamente por pessoas que nos classificam como algo sem mesmo nós mesmos entender sobre essas questões”, relata. 

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O estudante afirma que a colonização, que além de aniquilar diversos povos, foi responsável por destruir as culturas que pudessem aceitar relações entre pessoas do mesmo gênero.

“O processo de colonização das sexualidades indígenas foi violento e exterminou diversos corpos indígenas que tinham relações homoafetivas dentro de seus contextos. Muitos LGBTs indígenas sofrem com este processo histórico de tentativas de aniquilação cultural até hoje; minha realidade, cultura e povo não esteve livre desse desastre”, destaca.

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O povo Tupinikim sofreu uma grande influência do catolicismo, que figura em todas as comunidades. Hoje, existem várias igrejas católicas e evangélicas nos territórios indígenas, algo que aumenta os comportamentos homofóbicos. 

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“A herança colonialista se adentra em conjunto com as igrejas e afirmo que foi um dos principais meios de aniquilação das diversas sexualidades indígenas. Um caso marcante foi o assassinato de Tybyra, primeiro caso de homofobia documentado na história do Brasil, e que foi autorizado por missionários. No entanto, como nosso povo sofre por muito tempo com a colonização europeia, nossas crenças se misturam bastante com o cristianismo, que impacta diretamente no pensamento dentro da comunidade”, diz. 

“Nossa sociedade é estruturada sobre preceitos eurocêntricos, brancos e cisheteronormativos, no entanto, a pluralidade de povos que aqui havia ou foram trazidos forçadamente para cá, foram marginalizados e inferiorizados; assim, tudo que desviava-se da cultura europeia que pretendia se impor, foi dita como errada e sofreram diversas tentativas de aniquilamento. Assim, este território, sob domínio colonial foi-se institucionalizando e consigo, reproduzindo os preceitos, valor e moral de um povo que forçadamente chegou, colonizou, criou e ocupou as instituições. A reprodução do machismo, racismo e LGBTfobia, por exemplo, faz parte deste processo”, afirma. 

Sobre ser gay e indígena, Danilo afirma que sofre preconceito dos dois lados: “Viver em um país que se encontra no topo dos que mais matam pessoas LGBT+ no mundo é assustador, ser indígena em um país racista também. Ser indígena e LGBT+ no Brasil é lutar diariamente para nossa sobrevivência. Este duplo preconceito que somos expostos, primeiro por não seguir uma sexualidade ‘padrão’ e depois por ser indígena e não corresponder a estereótipos é estar sujeito a todo tipo de violência e violação contra nossos corpos”, detalha.

“Acredito que o desconhecimento das culturas indígenas faz com que diversos comentários racistas caiam sobre nós. A intolerância e ignorância contra os povos indígenas em nossa sociedade é gigante; muitos acreditam que não existimos mais, ou que nós só deveríamos viver isolados na floresta, fazendo com que sejamos excluídos de diversos espaços. Quando me assumi, ouvi e vi diversos comentários dirigidos a mim como 'não basta ser índio, ainda tem que ser viado', muito triste ter que passar por diversas opressões como essa principalmente em um momento em que estamos nos entendendo enquanto indivíduo em uma sociedade classista e opressora e, principalmente, ainda não entendia muito sobre questões de gênero e sexualidade”, afirma.

Danilo acredita que a discussão é o melhor caminho para trazer mais visibilidade para as pautas LGBTQIA+ e indígenas. Ele afirma que a sociedade em geral deve preocupar-se em respeitar o lugar de fala de cada grupo e não contribuir com os diversos silenciamentos que muitos sofreram e ainda vivenciam, impedidos de trazer suas próprias narrativas para contrapor as histórias hegemônicas que muitas vezes distorcem dos fatos.

"Além disso, é fundamental o incentivo em uma educação de qualidade, decolonial e inclusiva para que sejam difundidos os diversos acontecimentos históricos, assim como construir uma educação plural que respeite a diversidade cultural do nosso país. Infelizmente a gente sabe que nossa educação não está pautada nesse caminho e sim na criação de um exército de mão-de-obra”, finaliza.

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** Beatriz Neves é estudante de jornalismo. É estagiária de Soft News do iG desde março de 2021 e já escreveu para as editorias Delas, Receitas, Turismo, Gente, Canal do Pet e Queer. É apaixonada por tudo o que envolve livros, cinema e música, principalmente os clássicos.

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