Glauber Britto e Rhicardo Bartolomeu estão juntos há cinco anos e moram na Angola, país que descriminalizou a homossexualidade em fevereiro deste ano. Eles estão no país há pelo menos dois anos e sentem na pele os desafios de serem gays em uma nação conservadora que, aos poucos, tem se tornado mais tolerante.
Ao iG Queer, eles contam que a Angola não foi o primeiro país que os dois moraram juntos. Rhicardo é vice-cônsul no país e, antes ser transferido para lá, o casal também viveu na Austrália, que é mais liberal do que o Brasil e a Angola.
"Nos casamos lá e viver na Angola foi algo bem depois, em 2019. Quando chegamos no país, já havia discussões sobre descriminalizar a homossexualidade, ficamos aliviados, mas tinha a questão de educar as pessoas no dia a dia. Isso ainda demanda um tempo para que as pessoas entendam", diz Glauber.
"Exatamente em 11 de fevereiro de 2019, desembarcamos em Angola e, daí para frente, percebemos que, mesmo com a premissa de que a intolerância estava mudando, não seria fácil viver por aqui como um casal gay. Outros casais gays, que inclusive foram os diplomatas e seus companheiros que travaram essa luta para que as leis fossem atualizadas, nos receberam de braços abertos”, lembra Glauber.
Rhicardo comemorou a descriminalização e acredita que o casal seja "pé quente" por vivenciar pessoalmente uma mudança tão grande na legislação. "É sempre bom ser livre para amar. É a segunda vez que presenciamos uma vitória da comunidade LGBTQI+: a primeira foi na aprovação do casamento gay na Austrália", conta Glauber.
Antes de conhecer Rhicardo e até de ir para a Austrália, Glauber viveu na Angola por um ano. "Eu já morei na África entre 2011 e 2012 e era superrestrito, fui a trabalho e não podíamos falar que éramos gays ou nos comportar de outra forma", detalha.
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Apesar da homofobia e do medo, os dois tinham a segurança de serem estrangeiros e disseram que não há perseguição institucional a gays no país. "Eu acho que o Brasil talvez seja um pouquinho mais aberto, especialmente em cidades maiores, mas pelo o que eu noto os crimes homofóbicos são mais comuns no Brasil do que em Angola", afirma Rhicardo.
Glauber diz que a sensação de vulnerabilidade é parecida tanto na Angola quanto no Brasil. "Tínhamos as restrições, mas não deixávamos de ter a vulnerabilidade no Brasil. Como é o país que mais mata LGBTQI+, não tinha como ficar confortável vivendo aí", afirma.
O vice-cônsul diz que ser estrangeiro por lá também muda a experiência sendo LGBTQI+ e, antes da descriminalização, os dois participaram de uma parada LGBT em que sentiram que o país passava por evoluções.
"Vimos movimentos em 2019 que foi muito bacana presenciar, a comunidade mostrava um fôlego e dizia claramente que 'nós existimos, nós estamos aqui, nós vamos lutar', foi muito bom ver isso", conta Glauber.
Proteção
Como os dois são brasileiros, o casal entende que muitas vezes ser estrangeiro foi algo positivo no país. "Quando chegamos em Luanda, houve uma confusão com a nossa reserva de hotel, já que eu pedi uma cama de casal no quarto e a recepcionista entendia que para dois homens o 'normal' era ter duas camas no quarto, mas a gerente que liberou o quarto e era portuguesa entendeu que éramos estrangeiros. Notamos que a angolana ficou confusa e iria demorar para se acostumar", conta Glauber.
Além disso, os dois brincam que, por parecerem um com o outro, muitas situações desagradáveis foram evitadas por isso. "Nunca olham para nós como casal, olham como irmãos", diz Glauber. "No nosso caso a chance de olhar torto é menor, mas é aquilo: dizem que com o tempo um fica parecido com o outro", afirma Rhicardo.
Por conta da pandemia da Covid-19, os planos de casar foram adiados e, agora, Glauber e Rhicardo esperam a vacina e a liberação de voos para o Brasil para comemorar a união com a família. "Nós temos apenas a união estável, não casamos na Austrália. Assim que todos estiverem vacinados, podemos celebrar o casamento", diz Glauber.