Atila Angelo tem Pabllo Vittar como inspiração para se montar
Divulgação
Atila Angelo tem Pabllo Vittar como inspiração para se montar

O influenciador Atila Angelo (sem acento), de 20 anos, sucesso no TikTok, sempre teve uma vida difícil. Ele, a mãe e a irmã, de 15, de Limoeiro do Norte, no interior do Ceará, sobreviviam com o dinheiro da pensão que era de R$ 200 que o pai pagava para os dois filhos, mais um pequeno valor do Bolsa Família, e o dinheiro de faxinas que a matriarca fazia. Porém, quando sua mãe ficou com depressão, ele teve que ser o chefe da casa e passou a publicar vídeos para manter a família. 

Atila tinha 900 seguidores quando começou a gravar os vídeos, até que um deles, sobre a cidade de Limoeiro do Norte, viralizou. Atualmente, ele tem 120 mil seguidores no Instagram e mais de 1 milhão no TikTok. 

Antes de ser famoso nas redes sociais, ele já sabia que queria ser alguém importante, sobretudo na mídia tradicional. No começo, sonhava em ser apresentador e estar em frente às câmeras, e ao longo dos anos até criou um canal no Youtube em meados de 2012, mas teve que apagar porque a mãe, que é evangélica, não gostava de ver o filho com perucas e maquiagens. Aliás, desde criança, ele sabia que tinha vocação para o humor. 

Nessa época, improvisava os equipamentos de gravação com o que tinha: o seu tripé era feito de cano de PVC, a iluminação era feita com caixas de papelão, papel alumínio e algumas lâmpadas, e o celular era um Samsung Pocket. 

"Desde pequeno, mesmo antes de gravar vídeos, eu já fazia muita palhaçada. Sempre fui muito bem-humorado, alto-astral. Em todos os lugares que eu chego, gosto de fazer as pessoas felizes. Isso me deixa feliz, é gratificante quando uma pessoa diz para mim que se sente melhor, que melhorei o dia dela por conta dos vídeos que gravo", conta. 

Anos depois, ele retoma com o seu sonho e consegue atrair a atenção das pessoas por meio do seu humor na internet. “Nessa fase, já na pandemia, os vídeos que gravava e publicava eram apenas para divertir as pessoas e também para tentar lidar melhor com os problemas pessoais pelos quais passava. Foi sem intenção de lucrar, mas acabou também tendo um retorno financeiro, o que foi superbacana”, afirma. 

Luta diária

A vida de Atila nunca foi fácil, ele conta que já passou por muitas dificuldades, e houve um período que precisou comer na casa dos avós, pois não tinha nada para comer na sua. 

“Minha mãe ficou doente quando eu tinha 17 anos por conta de tudo que a gente passou.  Ela estava com depressão e precisei cuidar dela, cozinhar, e até levar a minha irmã para escola, e esses vídeos que me motivavam”, relembra ele, que ao terminar o ensino médio, focou em produzir conteúdos na internet. 

“Eu já fiz muito trabalho de graça na internet no início, mas depois que eu já tinha um público consolidado, passei a propor parcerias e algumas marcas aceitavam. Graças a Deus, hoje, eu consegui reverter essa situação, consegui comprar móveis, consigo pagar as despesas da casa, os remédios da minha mãe. Basicamente, toda nossa renda vem do que ganho na internet", celebra. 

Os seus vídeos de humor vão desde vídeos de maquiagem a imitação de personagens, sobretudo os femininos.  “O humor sempre esteve presente na minha vida, até já trabalhei como palhaço e animador de festas e toda a minha família é bem-humorada, apesar dos problemas”, cita. 

Hoje, Atila já teve vídeos compartilhados por vários famosos, como Anitta, a dupla sertaneja Maiara e Maraísa, Mari Fernandez e é seguido por famosos, como Mileide Mihaile e David Brazil.

Relação com a igreja evangélica 

Atila Angelo com sua família; irmã, sobrinho e mãe
Divulgação
Atila Angelo com sua família; irmã, sobrinho e mãe

A sua história também tem outro lado da moeda, pois ele foi criado na igreja evangélica, mas deixou a religião quando expôs a sexualidade: "O discurso de aceitação entra em conflito com o de mudança”, acredita. 

Embora sua mãe não aceite explicitamente sua homossexualidade, ele diz que ela hoje respeita mais e enxerga isso de outra ótica: a partir do humor. 

Nesse meio tempo, a irmã do influenciador engravidou aos 13 anos, e o jovem passou a gravar também com o sobrinho. "Viralizei no TikTok vídeos com mais de 23 milhões de visualizações com ele", completa. A sua relação com o sobrinho também é para ele como uma relação de pai e filho. 

Compartilhar a sexualidade para a família e para os amigos não é um processo fácil para a maioria das pessoas LGBTs, e o influenciador também passou por esse dilema da maioria dos jovens, que, na verdade, é o medo de não ser aceito. Como já gravava vídeos com peruca e roupas femininas, este momento foi algo esperado e natural.  

"Meu processo de compartilhar a sexualidade com a minha família foi algo muito espontâneo. Quando completei 17 anos, eu botei na minha cabeça que eu tinha que me assumir. E aquilo me deixou muito confuso, muito preocupado. Tive medo, senti aquela aflição. Mas a partir do momento que eu botei na minha cabeça que eu não precisava chegar e falar, só bastava eu viver e mostrar quem eu era, tudo fluiu. Claro, o meu trabalho me ajudou muito porque fui me mostrando de maneira superleve e de uma maneira normal. Eu fui gravando meus vídeos vestido de mulher, minha família foi vendo que o público gostava, que tinha um pessoal que me acompanhava, que me aceitava do jeito que eu era, do meu jeito de ser, do que eu vestia, do que eu falava. E minha família aceitou", diz. 

No seu processo de descoberta, ele relembra que desde os oito anos ele sabia que era diferente, pois ele sentiu um amor puro por um colega. E, aos 12, ele se entendeu melhor ao se apaixonar pelo baterista da sua igreja. Mas só se assumiu aos 17. 

Apesar de ter frequentado igrejas que aceitavam LGBTs, Atila acredita que eles pregam uma mudança, o que contrapõe com aceitação. Por ficar confuso com esse discurso, ele acabou deixando a religião, já que aceita sua orientação sexual. 

"Não frequento mais por conta disso. Apesar de muitas igrejas que já frequentei falar que aceitam a gente como somos, ao mesmo tempo, dizem que Deus vai nos mudar, que ele transforma. O discurso de aceitação entra em conflito com o de mudança. No fundo, o que eles querem é que a gente acabe mudando, já que a igreja prega muito isso. E é isso que deixa a gente muitas vezes muito confuso. Mas eu me aceito assim, sei que eu sou assim, eu me amo assim e acredito em Deus, claro. Mas não frequento mais por conta disso", pondera.

Como na maioria dos conteúdos publicados para seus seguidores ele está com roupas femininas e com maquiagem, ele sofre ataques homofóbicos, mas o cearense diz que isso não é tão comum. 

“Eu gosto muito de estar fazendo amizades. Mas isso já me feriu, nem sempre dá para levar preconceito com bom humor. Às vezes, a gente se abala um pouco, mas tento esquecer", afirma. 

Ele comemora que os ataques que sofre on-line são poucos comparados aos elogios e comentários de pessoas alegres com seus vídeos. Ele conseguiu criar uma comunidade de pessoas que gostam muito do seu trabalho, do que ele posta e cria, que na visão dele, é algo mais leve e familiar. 

“Acho que isso acaba não atraindo pessoas negativas e, quem me acompanha, sabe que eu faço isso por amor. Geralmente, quando recebo mensagens homofóbicas ou de outro tipo de ódio, eu tento responder de maneira que eu consiga conquistar a pessoa e acabe transformando-a de hater para seguidor, que é o que já aconteceu muito comigo. Porque às vezes a pessoa julga a gente pela primeira imagem que tem ali, viu alguma coisa e não gostou ou pela maldade, a gente levando com bom humor, consegue reverter a situação", explica. 

Inspirações e sonhos 

Atila Angelo como drag queen
Divulgação
Atila Angelo como drag queen

Além disso, ele tem como inspiração Pabllo Vittar, que apesar de não atuar, assim como ele, faz parte da comunidade LGBT e veio de uma pequena cidade do interior. 

“Eu me inspiro muito na carreira da Pabllo. Na história de vida dela. Ela saiu lá do interior, persistiu e uma hora explodiu e viralizou. Hoje é a maior drag queen do mundo. Me inspiro nela também para me montar, já que é uma drag mais beauty. No humor, gosto de acompanhar pessoas que são do mesmo ramo para me inspirar", afirma. 

Outra pessoa a quem o cearense se inspira é o saudoso Paulo Gustavo. “Ele fazia um humor leve, sem discriminar, menosprezar ou ofender ninguém”, pontua. 

Nos planos dele, há também o desejo de atuar e ter o próprio programa de TV: “Tenho um sonho de me tornar um ator ou até mesmo ter um programa de TV. Trabalhar com um personagem gravando conteúdo para uma emissora, para alguma marca", conclui ele que já fez cursos amadores de teatro que foram essenciais para construir quem é hoje.

Agora você pode acompanhar o iG Queer também no Telegram!  Clique aqui para entrar no grupo. Siga também o  perfil geral do Portal iG.

** Julio Cesar Ferreira é estudante de Jornalismo na PUC-SP. Venceu o 13.º Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão com a pauta “Brasil sob a fumaça da desinformação”. Em seus interesses estão Diretos Humanos, Cultura, Moda, Política, Cultura Pop e Entretenimento. Enquanto estagiário no iG, já passou pelas editorias de Último Segundo/Saúde, Delas/Receitas, e atualmente está em Queer/Pet/Turismo.

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!