A expressão “ideologia de gênero” passou a ser conhecida por muitos brasileiros nos últimos quatro anos, pois é utilizada, em grande parte, como uma forma de deslegitimar o debate sobre gênero e sexualidade e fortalecer o discurso conservador no país. Porém, como forma de modificar essa ótica e abarcar outros temas vistos como tabu pela sociedade, nasce a Escola Nacional de Gênero e Sexualidade . Lançada em julho, a plataforma reúne diversos materiais educativos e informativos.
"Ideologia de gênero" é uma expressão depreciativa usada pelo conjunto de setores conservadores internacionais contrários às discussões relacionadas a pautas LGBTQIA+ e de direitos humanos, voltadas para o debate sobre equidade de gênero, sexualidade e direitos reprodutivos.
A plataforma virtual nasceu da parceria entre Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas ( INNPD ), Associação Nacional de Travestis e Transexuais ( Antra ) , e a Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas ( Renfa ). De forma colaborativa, estas entidades reuniram especialistas para a produção de um relatório e ainda a formatação de um espaço para a difusão de informações qualificadas e de fácil acesso a fim de fortalecer discussões antirracistas e de direitos humanos como transgeneridade, redução de danos associados ao uso de drogas, sexualidade, classe e gênero.
O projeto, construído com financiamento da Wellspring Philanthropic Foundation ( WPF ), é fruto de um processo de pesquisa conduzido durante a pandemia e que teve como objetivo central a construção do combate à crescente ofensiva antigênero no país.
“O projeto nasceu de um anseio que tínhamos desde que nos constituímos enquanto organização. Sempre foi nossa meta, abordar questões de gênero, que atingem principalmente os direitos de pessoas negras LGBTQIA+. Nossa parceira Renfa sempre foi uma de nossas referências neste debate. Nos conectamos com a Antra e assim nasceu o projeto, que foi construído em cerca de um ano”, conta Dandara Rudsan, pesquisadora da Iniciativa Negra Por Uma Nova Política Sobre Drogas.
Em um espaço contemporâneo de difusão de informações, a Escola Gêneros possibilita o acesso ao conhecimento e dá suporte para formação e intervenção nos espaços comunitários e espaços de formulação de políticas para população negra e população LGBTQIAPNB+.Além disso, há uma linha do tempo que evidencia os retrocessos atestados por Projetos de Lei nos últimos três anos (2019-2021).
“A interdisciplinaridade e interseccionalidade são as bases desse projeto. Todas as organizações envolvidas, atuam em diversas frente com múltiplos públicos e sentimos que isso foi a força necessária para construir ações e desenvolver uma pesquisa sólida”, pontua Dandara.
O site tem cinco abas divididas em: Relatório; Videoaulas; Pesquisa Executiva, Pesquisa Legislativa e Linha do Tempo.
Em “Relatório”, é possível encontrar o panorama das agendas de gênero, sexualidade, direitos humanos e políticas sobre drogas entre 2018 e 2021; “Videoaulas”, até o momento, conta com três produções: ‘Políticas antigênero’; ‘Ideologia de gênero no meio progressista’ e ‘Mulheres, drogas e saúde’.
A “Pesquisa Executiva” é um espaço destinado a apresentar elementos sobre os movimentos no poder executivo federal nas pastas de gêneros, sexualidade e política sobre drogas. Já em “Pesquisa Legislativa”, é possível conferir propostas em tramitação ou apensadas com base em palavras-chave envolvendo a comunidade LGBTQIAPNB+, como ‘travestis’, ‘mulheres’, ‘não binários’, ‘orientação sexual’ etc. Ao todo, foram 247 PLs encontrados até dezembro de 2021, sendo eles positivos, negativos ou neutros em relação à temática de gênero e sexualidade no país.
E por fim, a "Linha do Tempo", que mostra marcos sobre as políticas públicas, processos legislativos, executivos e da sociedade civil organizada entre 2019 e 2021. A fim de firmar as bases para a construção de uma contranarrativa, Gêneros fornece um panorama geral sobre o debate, denunciando retrocessos recentes nas agendas e pautas dos movimentos de mulheres, LGBTQIA+, de direitos humanos e de pessoas que usam drogas.
“O público do projeto é a sociedade. Temos o foco em movimentos e lideranças que atuam na agenda de gênero, visando fortalecer os espaços que estas pessoas ocupam e os discursos que defendem. Sabemos que o formato digital ainda limita o acesso de muita gente, principalmente nas regiões periféricas e em comunidades amazônicas, mas estamos trabalhando de maneira contínua para, em breve, alcançarmos estes territórios com novos formatos e estratégias de distribuição. Isso também nos faz refletir como é imperativo debatermos sobre acesso à informação e equidade tecnológica no Brasil e na América Latina”, finaliza a pesquisadora.