Construção. Essa é a palavra que João Luiz Pedrosa usou para descrever o que foi o seu ano de 2021. O professor de geografia deixou o anonimato e a cidade de Santos Dumont, em Minas Gerais, para encarar o desafio de entrar para o elenco do “BBB”. Dentro da casa, a passagem de João foi marcada por seu bom humor, uma ótima leitura do jogo e a capacidade de fazer o jogo rodar, quando tinha o poder nas mãos.
A passagem dele no reality não só foi longeva (ele foi o 12º eliminado da edição) como rendeu frutos, muito mais do que ele imaginaria. “Eu queria ganhar R$ 1,5 milhão, esse era o meu principal objetivo. O que veio depois extrapolou as minhas expectativas”, contou o professor em entrevista exclusiva ao iG Queer.
O sucesso que João alcançou no reality fez com que ele deixasse a sala de aula para embarcar na carreira de apresentador e influenciador digital que fala em prol da educação e da geografia, duas de suas maiores paixões. Além disso, ele conseguiu garantir sua permanência na televisão e entre as estrelas, atuando, principalmente, como apresentador.
No canal Futura, ele ganhou o programa “Entrevista” e integrou o time de apresentadores do “Trace Trends”, exibido pelo Multishow e GloboPlay. O primeiro dialoga com especialistas sobre o conhecimento; o segundo é um programa de variedades que pauta a cultura afro urbana.
Agora, João se prepara para lançar seu primeiro livro, “Como Essa Calopsita Veio Parar no Brasil?”, que chega às livrarias no dia 24 de janeiro e está em pré-venda . O professor conta que a escrita do livro começou cerca de 15 dias após sua saída do “BBB” e que seu intuito era fazer com que as pessoas se interessassem pela geografia.
“Eu não queria lançar uma biografia, mas um livro de divulgação científica de geografia que estaria relacionado à minha vida. Estamos vivendo um momento de combate à desinformação e isso só é feito com informação verídica e séria, com fontes e estudos”, afirma.
Ao iG Queer, João Luiz fala sobre suas expectativas em relação ao programa, a sensação de estranheza e alegria ao ver que a Xuxa sabia quem ele era, a amizade com a influenciadora Camilla de Lucas e o que ele espera que aconteça em se 2022.
iG Queer: Há um ano, o “BBB 21” estava prestes a começar. Você se lembra do que estava fazendo naquela época?
João Luiz: Eu estava tendo uma leve ansiedade por não saber o que que ia acontecer da minha vida. A data de estreia do “BBB” estava se aproximando, e no fim de 2020 a pandemia estava pegando solta. Fiquei quietinho em casa no Ano Novo, lembro que o Igor [Moreira, namorado de João] e eu fizemos uma comida, nem vi meus pais. Mas eu estava nessa expectativa de saber o que que ia acontecer, se ia rolar de entrar no programa ou se não ia. Eu estava dando aula esperando a produção falar alguma coisa. E aí, logo depois, eles me capturaram.
iG Queer: Quais expectativas você tinha para a sua vida pós-BBB? Acha que elas foram cumpridas ou superadas?
João Luiz: Na verdade, eu não tinha uma estratégia do que eu queria conquistar após a saída do programa. Eu queria ganhar R$1,5 milhão, esse era o meu principal objetivo. O que veio depois extrapolou as minhas expectativas. Eu não conseguia ter dimensão de nada disso dentro da casa. Depois que eu saí e as oportunidades começaram a aparecer, eu achei muito legal. Tudo o que eu construí dentro do programa fez com que eu pudesse apresentar dois programas, escrever um livro, fazer várias outras coisas. O “BBB” teve muito esse papel de fazer as pessoas entenderem que a gente é muito além do que o reality mostra.
iG Queer: Você passou por diversas transformações depois que saiu da casa, mas qual foi a oportunidade mais maluca que já aconteceu para você desde então?
João Luiz: Das minhas últimas experiências, acho que foi entrevistar a Xuxa no Prêmio Multishow. Em janeiro de 2021, eu jamais imaginaria que, em dezembro do mesmo ano, eu estaria entrevistando a Xuxa e que ela ia saber quem eu sou. Tiveram muitas outras coisas que consegui, como os programas no Futura, no GloboPlay e no Multishow. Mas entrevistar a Xuxa, o Nando Reis… Estar ao lado de pessoas que antes estavam na minha na minha alçada da admiração e hoje elas saberem quem eu sou é surreal. No próprio Prêmio Multishow a IZA, antes de cantar, me viu com a Camilla e nos deu oi. Eu só pensava: “O que você tá fazendo? Vai cantar, me deixa aqui te vendo” (risos).
iG Queer: Desde sua entrada no “BBB”, você deixou sempre muito claro que a sua principal bandeira é a educação. Depois do programa, você conseguiu continuar a lecionar? Como isso foi ressignificado?
João Luiz: Não voltei para a sala de aula, não. Não tinha como, nem se eu quisesse. Eu tive que repensar e me utilizar das plataformas que eu tenho hoje e utilizá-las para essas questões, desde as redes sociais até os lugares por onde vou, os programas que apresento ou no livro que eu escrevi.
iG Queer: Também é uma possibilidade de ir além da experiência da sala de aula e alcançar muitas outras pessoas de perfis diferentes. Isso também faz diferença?
João Luiz: Com certeza. Acho que as redes sociais têm esse potencial. O que eu tenho feito no Instagram, no Twitter e no TikTok é que eu não mostro só a minha vida, mas uso as redes sociais para falar sobre assuntos sérios e contemporâneos. Não adianta eu só ficar mostrando meu café da manhã ou a paisagem linda – claro que eu vou fazer isso, porque eu adoro mostrar isso também. Mas vou mostrar outras visões.
iG Queer: Você falou sobre o seu livro, “Como Essa Calopsita Veio Parar no Brasil?”, que já está em pré-venda. Por que você decidiu escrever um livro e o que espera deixar para as pessoas com ele?
João Luiz: Quando eu saí do programa, recebi um convite da HarperCollins para lançar um livro. A primeira coisa que falei é que não queria lançar uma biografia, mas um livro de divulgação científica de geografia que estaria relacionado à minha vida. Em alguns capítulos eu acabo abordando algumas histórias e, delas, vou puxando as informações sobre a leitura do mundo. Estamos vivendo um momento de combate à desinformação, e isso só é feito com informação verídica e séria, com fontes e estudos. Comecei a escrever quinze dias após a minha saída do programa, foi bem rápido. Desde então começamos a desenhar a ideia do livro.
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Foi algo bem interessante para mim. Quando vi o produto final e reconheci cada palavra, vi que ali estão coisas que eu construí durante a minha vida durante, minha formação e minha profissão, fiquei emocionado. Espero que ajude as pessoas a ver um mundo sob um novo olhar. A geografia faz parte da paisagem mas é possível percebê-la de uma outra forma. Quero que as pessoas entendam que a geografia está na nossa vida.
iG Queer: Além da educação, a sua participação no “BBB” foi emblemática para pessoas pretas LGBTQIA+. Você sente que essas essas pautas se tornaram uma responsabilidade maior pra você depois do programa?
João Luiz: Eu não sei se é uma responsabilidade individual para mim. O programa teve a capacidade de mudar muito nos últimos anos. Se pegarmos o “BBB 4”, o número de pessoas negras é muito menor do que o “BBB 21” e o “BBB 19”, que teve um dos maiores elencos negros até então. Acho que isso está muito atrelado ao grande sucesso do programa. Se for colocar numa casa um monte de pessoas que o público não se identifica, não vai dar certo. A partir do momento que você coloca um monte de gente diferente, as pessoas passam a se ver na televisão de uma outra forma, e isso começa a alcançar mais gente.
Para mim tem muito esse sentido, mas não acredito que seja uma responsabilidade minha. Tem que ser algo generalizado. Eu não queria e nem gostaria de ganhar esse troféu de “o participante negro LGBT”. Tem que ter vários outros em outras edições, nas novelas, no jornal... Em vários outros lugares.
iG Queer: Quando o “BBB 21” estava no ar, muitas pessoas afirmavam que você e a Camilla representavam muito a questão da autoestima preta, porque vocês estavam sempre se enaltecendo e se apoiando. Como você acredita que isso possa ser importante em um país em que muitas pessoas pretas ainda têm dificuldade de compreender suas próprias características?
João Luiz: Eu e a Camilla estabelecemos uma relação de cumplicidade. A gente se identificou muito não só nas questões sociais e políticas, mas de vida. Amizades dentro de um reality show não são pautadas só no jogo, mas envolvem outros tópicos como família, vulnerabilidades, fraquezas… Acho que a gente conseguia fazer isso juntos, de se abrir um para o outro e dizer o que a gente estava sentindo além do programa.
Quando a gente vê, por exemplo, a própria figura da Camila, ela tem uma proporção de notoriedade muito boa para ela. Mas se pegarmos quem são as grandes blogueiras com mais de dez milhões de seguidores, talvez ela seja uma das únicas negras ali no meio. Ela tem um papel muito forte. É importante a gente se enaltecer e falar sobre autoestima porque a gente precisa ter outras figuras. Pensamos muito em fazer isso não só no programa, mas na amizade que construímos aqui fora também.
iG Queer: Até porque isso amplia as narrativas de pessoas negras na mídia, né? Foge da questão de que existe apenas sofrimento…
João Luiz: Com certeza, porque a gente quer falar de outras coisas também, sabe? Eu quero falar sobre pautas raciais, óbvio, porque isso vai sempre estar relacionado à minha vida e a de todo mundo. Mas também quero falar sobre meu livro favorito ou minha música favorita, que são perguntas que nem sempre são feitas para a gente. É sempre: “E aí, como é que você está? Mas me conta lá aquela vez”.
iG Queer: Você comanda o “Entrevista”, no canal Futura, e é um dos apresentadores do “Trace Trends”, exibido pelo Multishow e GloboPlay. Além dessa presença, você está sempre em algum evento importante, como as premiações, como apresentador ou público. Esse mundo te assustou no início ou você sempre se sentiu à vontade?
João Luiz: Vou ser bem sincero: não me assustou. Foi muito leve e orgânico, as coisas foram funcionando. Fui pegando dicas, estudando bastante. Não tem muito erro quando você se dedica e faz acontecer. É bem tranquilo.
iG Queer: Existe mais algum plano que você queira colocar em prática em 2022?
João Luiz: Acho que esse é um ano de consolidação, enquanto 2021 foi um ano de construção. Vou continuar apresentando os programas e estudando bastante para ver como as coisas vão funcionar a partir de agora. Quem sabe não escreva um segundo livro… Vai ser legal.
iG Queer: Depois de ter participado do “BBB” e saber como é que funciona, você vai acompanhar o “BBB 22”?
João Luiz: Com certeza! Vai ser ótimo. Vou poder acompanhar de forma muito mais leve. Vai ser uma experiência doida porque vou assistir pela primeira vez depois de ter participado. A sensação vai ser boa porque eu vivi aquilo e vou conseguir notar como cada edição se comporta. Talvez essa sensação vá se perdendo nas edições futuras, mas vai ser divertido por agora porque esse é um sentimento ainda recente para mim.
iG Queer: Se você pudesse dar um conselho para quem topou enfrentar o “BBB 22”, o que você diria?
João Luiz: Não mentir! É muito ruim para a pessoa ser pega na mentira, falando sobre o que fez fora da casa. Não mente, não! Deixa o “lá fora” lá fora e viva o momento.
iG Queer: Acha que os participantes vão ter consciência disso nesta edição?
João Luiz: Acho que não vão, não (risos).