Jair Bolsonaro proibiu a distribuição de absorventes de forma gratuita na última quinta-feira (7)
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Jair Bolsonaro proibiu a distribuição de absorventes de forma gratuita na última quinta-feira (7)


Na última quinta-feira (7), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou o PL nº 4.968/2019, que cria o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, mas vetou o artigo que assegurava a distribuição de absorventes de forma gratuita . Além de 5,6 milhões de mulheres de baixa renda, o veto deve impactar a saúde e higiene básica de pessoas intersexo e homens trans.

O projeto original destinaria os absorventes para pessoas em idade escolar matriculadas na rede pública, em situação de rua, vulnerabilidade social e que cumprem pena no regime prisional. “Pela leitura que se faz, de pronto, verifica-se que sequer há menção expressa ao público de homens trans. Isto é, não há uma clareza nos métodos de alcance, aumentando o abismo de invisibilidade no qual são inseridos”, explica Danielle Biazi, advogada especialista em direito civil.



Ela diz que o fato do Brasil ser o país que mais mata pessoas trans no mundo já ilustra o impedimento de um amplo debate acerca dos direitos desta população. “Homens trans não apenas menstruam como engravidam. A exclusão em projetos tais revelam um comportamento transfóbico”, complementa.

Amiel Vieira, sociólogo transmasculino e intersexo, afirma que a discussão relacionada à distribuição gratuita de absorventes é uma questão de gênero, raça e classe, já que não são todas as pessoas que têm condições financeiras. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), mulheres pobres precisam trabalhar quatro anos para ter absorventes ao longo da vida . “Quando se veta o acesso a esse tipo de política, que beneficiaria uma pessoa sem dinheiro suficiente para comprar um absorvente, aquele indivíduo está sendo negado à dignidade menstrual”, afirma o sociólogo.

Para Vieira, a proibição da proposta desqualifica e ignora a saúde de qualidade às pessoas com útero. Para além das demandas envolvendo saúde menstrual, a falta de condições financeiras destas populações geram déficits também relacionados à saúde mental e corporal.

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O veto continua a contribuir com essa grande lacuna em se debater a plenitude da existência trans, incluindo a saúde. “Precisamos pensar em como o Estado poderia contribuir, quando na realidade ele vira as costas para essas pessoas e diz que elas não são dignas de um Estado que pense nelas”, afirma.

Veto de distribuição gratuita de absorventes fere direitos

Biazi diz que a saúde menstrual está prevista nos direitos humanos fundamentais e consagram a autonomia de cada indivíduo em relação ao próprio corpo. “É certo que o direito fundamental à saúde contempla, em outras medidas, o acesso à higiene, saneamento básico e bem-estar dos indivíduos como um todo. Este é o degrau número um da contemplação da dignidade e aspecto dos mais elementares para a erradicação da pobreza em todos os seus sentidos”, explica.

No caso da população trans, já marginalizada no país, Biazi explica que o Estado deve garantir o mínimo para uma existência dotada de direitos para que esses indivíduos possam exercer suas identidades, potencialidades e realizações individuais de maneira plena. Para isso, se vê necessária a criação de políticas inclusivas para diminuir desigualdades sociais e parar de ferir direitos aos quais pessoas trans e intersexo estão sujeitas.

“Quando o Estado nega acesso à saúde, no caso do veto por meio de higiene básica, ele está dizendo que a saúde e a dignidade menstrual dessas pessoas não têm importância ou valor. Isso é uma violência que tira a possibilidade de ser enxergado como uma pessoa. Pessoas intersexo e transmasculinas habitam a invisibilidade. Não olhar uma política de Estado que auxilia a higiene dessas pessoas contribui para pensá-las como cidadãos indignos ao acesso à saúde”, reflete Vieira.

Impacto torna invisível

Além do Estado não colocar essas demandas de higiene e saúde em pauta, o impacto faz parte de uma longa cadeia que coloca esses assuntos em lugar invisível. Por outro lado, Vieira explica que, atualmente, há uma certa visibilidade sobre esses assuntos nas redes sociais; no entanto, eles não chegam às bolhas de pessoas sem útero. No caso, Amiel se refere aos homens cisgênero.

“Esses homens contribuem para o patriarcado e, por isso, deveriam repensar como estão contribuindo para essas políticas. Deveriam pensar nas violências que ocorrem com pessoas com útero e contribuir para que isso não aconteça”, esclarece.

“O acesso à saúde que é permeado pela higiene deveria ser uma questão levantada não só por pessoas com útero, mas também as sem útero. Estamos falando da vida de pessoas que todos os meses estão à mercê do próprio corpo e não têm acesso a uma higiene digna. As pessoas sem útero devem interceder porque somos pessoas como eles, que pagam impostos e com quem vivem o cotidiano lado a lado."

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