Um levantamento realizado pelo Instituto Atlas, em julho, aponta que 60% dos eleitores votariam em um candidato assumidamente gay para a presidência no Brasil. Em contrapartida, 24% assumem que não votariam e 17% disseram não saber se votariam ou não.
Recentemente, o posicionamento do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que revelou que é gay durante uma entrevista ao programa "Conversa com Bial", reacendeu também a discussão sobre diversidade na política. Para o especialista em ciência política Felipe Milanesi, um dos principais desafios para um presidente gay no Brasil é a naturalização da presença de candidatos homossexuais no país.
Desse modo, quanto maior o número de candidatos assumidamente LGBTQIA+, bem como cada vez mais pessoas eleitas, mais a naturalização das presenças deles nesses espaços. Embora seja um avanço, ainda é um número proporcionalmente bastante inferior à presença dessas pessoas na sociedade, especialmente no âmbito nacional, onde a pouca proximidade dos candidatos com eleitores abre margem para que preconceitos impactem mais na decisão do voto.
Durante a pesquisa realizada pelo Atlas, foram ouvidas 2.884 pessoas entre os dias 26 e 29 de julho e o estudo tem margem de erro de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos. As mulheres são o grupo político com maior apoio aos políticos LGBTQI+: com recorte de gênero, 69% delas afirmaram que votariam em um candidato gay, contra 50% entre os homens.
Apenas 19% das entrevistadas afirmaram que não escolheriam um candidato abertamente gay, que teria também a rejeição de 29% dos homens ouvidos pelo levantamento.
O dado surpreende também tendo em vista que o Planalto atualmente é ocupado por Jair Bolsonaro, um governante conhecido por proferir comentários homofóbicos. Em relação a isso, Milanezi acredita que a tendência histórica é que, após um período conservador ou de intolerância governamental, ressurja novamente governos progressistas. Entretanto, desde a redemocratização, o país nunca elegeu um presidente que tivesse valores abertamente tão conservadores e reacionários, deixando o futuro incerto.
“Lideranças com certo nível de popularidade podem reforçar valores ou até mesmo contrariar tendências por meio de sua retórica, reforço de valores e naturalização de opiniões antes vistas com ressalvas”, comenta.
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Desta forma, para o cientista, embora haja poucas pesquisas que apontem o impacto do bolsonarismo na cultura política do Brasil, o efeito conservador do bolsonarismo deve ser duradouro, pelo menos entre os seus apoiadores.
“O crescimento do percentual de evangélicos na população brasileira, que é um grupo que historicamente têm menores níveis de aceitação à união homoafetiva e à adoção de crianças por casais homoafetivos, também é um dos desafios e um ponto que deve-se levar em consideração na análise”, aponta Milanesi.
Questionado sobre se a existência de uma cultura política conservadora impacta nas possibilidades de eleger um presidente gay, Felipe responde que sim, uma vez que mesmo que as pessoas não se vejam como preconceituosas acabam reproduzindo comportamentos intolerantes. Mesmo que manifestem abertamente opiniões mais progressistas.
“Os níveis de aceitação à diversidade e igualdade de gênero, bem como preocupações ambientais são baixos, embora apresentem um constante aumento com o passar do tempo, fato que pode ser explicado pela maior assimilação destes valores pela população mais jovem”, explica o especialista.
Minorias na Política
Segundo levantamento de Pedro Barbabela, hoje há 124 pessoas LGBTQIA+ eleitas, número muito abaixo considerando os dados de LGBTS na sociedade. Além de toda intolerância, este número também é um reflexo da condição vulnerável com que este grupo está na sociedade.
Entre 2014 e 2020, pelo menos 3.514 pessoas LGBTQIA+ foram assassinadas na América Latina e no Caribe, das quais 1.401 delas por motivos relacionados ao preconceito contra sua orientação sexual ou identidade de gênero.
O Brasil continua como o país que mais assassina pessoas LGBTQIA+ em todo mundo, seguido, respectivamente, pelo México e os Estados Unidos, que é resultado da falta de políticas públicas. A LGBTfobia mata uma pessoa a cada 26 horas no país.
Em alguns países da América do Sul, há alguns avanços de LGBTS na política. Em Bogotá, capital da Colômbia, há Claudia López Hernández, uma prefeita lésbica. Na Argentina, Gustavo Melella, governador da província de Tierra del Fuego.
Políticas públicas
Diante dessas condições políticas, o especialista aponta que a melhor forma de avançar na representatividade é promovendo a naturalização da presença de minorias nas instâncias de representação e no espaço público. “É importante a implementação de ações afirmativas e de cotas nas eleições legislativas, de modo a reparar desigualdades históricas do Brasil”, defende.
Além disso, Felipe finaliza abordando a importância de incentivar e promover candidaturas que pautem essas reivindicações e que se utilizem do espaço público para promover a diversidade e valores políticos de tolerância e aceitação.