Tarso Brant, que está de volta na TV na reexibição da novela “A Força do Querer” (2017), serviu de inspiração para a construção de Ivan , interpretado por Carol Duarte, que se assume trans e passa pelo processo de transição. Convidado também para atuar, Tarso vivia uma situação parecida na época. Ele havia recém completado sua transição de gênero e conseguido redefinir seu nome, após oito meses com o processo na Justiça.
“Internamente, já estava lidando com isso desde criança, mas era algo que eu guardava. Depois que consegui mudar minha aparência, olhei no espelho e perguntei ‘quem é essa pessoa que está comigo?' Aí surgiu o nome Tarso de uma conversa com meus pais”, lembra.
Naquele ano, após compartilhar suas vivências para a escritora Gloria Perez, em um laboratório com outros homens trans, recebeu o convite para atuar na novela interpretando ele mesmo. “Gloria foi bem cuidadosa ao falar do tema e tocou as pessoas pelo sentimento. Qualquer um, por mais que não tenha a mesma vivência, que não compreenda, vai sentir”, afirma.
“Me senti muito identificado com o Ivan e acredito que outros homens trans também”, diz Tarso.
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Hoje, aos 28 anos, ele conta que a recepção da novela foi diferente e as pessoas estão menos preconceituosas, entretanto diz que o processo para chegar na situação ideal é lento.
“Durante a reexibição, percebi as pessoas mais abertas e receptivas com esse assunto, apesar da gente estar passando um momento delicado. Em 2017 foi uma quebra de paradigmas, que pegou as pessoas mais bruscamente e muitas se retraíram”, comenta.
Sobre o audiovisual brasileiro, Tarso acredita que a novela abriu uma “porta” para temáticas transexuais e LGBQIA+. “A nossa sociedade é impositiva, fomos ensinados a obedecer, não a pensar. Mas agora percebemos que podemos viver como quisermos, sem dar satisfação para ninguém. Isso reflete no aumento de temáticas trans na TV. Os transexuais que estão chegando agora estão se reconhecendo mais, assim como os pais que têm seus filhos pequenos que são trans”, conta.
“Depois de alguns trabalhos audiovisuais, as redes de produção cinematográficas e telenovelas estão abrindo espaço para pessoas trans. Entendem que elas são pessoas em dobro, se tratando de vivências de lugares. O mercado de trabalho está tendo uma abertura maior para a diversidade, de pessoas que antes eram condenadas pela sociedade”, explica Tarso.
Ao ser questionado se pessoas cis podem interpretar personagens trans, como foi o caso de Ivan, ele comenta: “Tudo é uma construção. Naquele momento coube à autora da novela escolher uma personagem cis, mas agora é necessário que pessoas trans interpretem não só pessoas trans no cinema, mas outros papéis. Antes de ser pessoa trans, eu sou o Tarso. Cada um é único, independente de quem seja e como se veste”.