Por muitos anos os fãs brasileiros de “RuPaul’s Drag Race” , a competição internacional de drag queens que ganhou o mundo, pediam à produção que o Brasil recebesse uma versão para chamar de sua, e finalmente RuPaul resolveu atender aos chamados.
Neste ano foi exibida a primeira temporada brasileira do famoso reality show e a grande vencedora foi Organzza, drag queen que é vivida pelo artista carioca Vinícius Andrade, de 31 anos. Em entrevista exclusiva ao iG Queer ele falou sobre como foi a sensação ao saber que havia ganhado a competição.
“Foram muitas sensações e emoções ao mesmo tempo. Foi, sim, uma sensação de realização, de dever cumprido e de alívio. Cada dia vai caindo um pouquinho mais a ficha”. A queen ainda comenta que embora “muitas coisas negativas aconteceram na internet”, é sempre importante lembrar que “muitas coisas positivas também aconteceram. Muito amor foi emanado.”
Organzza foi alvo de muitos ataques durante a exibição do programa, criticada por seu desempenho, além de ter sofrido episódios de racismo.
“Eu pude, antes mesmo do final do programa, ter viajado para muitos lugares, muitas cidades e muitos estados. Eu sempre tive uma relação e uma troca com o público que é aquele meme: ‘Se eu fechar o Twitter, essa discussão existe?' Ela não resiste [fora do ambiente virtual]. Existe sim essa coisa de grande barulho negativo de hater que foi feito na internet, mas essa não era a minha realidade. Não era isso o que eu senti”, declara a artista.
Contudo, Vinícius diz que no final do programa as coisas se intensificaram e passaram de muitos limites.
“As coisas chegaram em outras pessoas ao meu redor. Isso realmente foi algo preocupante e alarmante, mas ainda assim eu estava indo nos lugares e via as pessoas ovacionando, gritando meu nome e me amando.”
Organzza diz que prefere ficar com a lembrança e a energia positiva que recebeu. Ela aproveita e brinca dizendo que os haters, na verdade, “também são grandes fãs”. “Vamos falar a verdade aqui. Eles engajam, comentam, passam 24 horas dia falando de você. É fã ou hater?”.
Reinado
“Quem assistiu o programa sabe sobre o que eu vou falar agora. Eu sou uma pauta. Sou uma pessoa preta, pobre, do subúrbio do Rio de Janeiro, LGBT+, uma pessoa que vive com HIV… A minha vida é essa. Então eu vou falar sobre o que eu vivo”, afirma a vencedora sobre como pretende levar seu reinado como campeã da primeira temporada do reality.
Organzza critica ainda quem não enxerga o caráter político da arte drag. “Tem gente que fala assim, ‘não tem que misturar militância com drag’, mas essa arte é política, é uma arte militante, é uma arte que está o tempo todo questionando, o tempo todo provocando discussões. Esse é o ponto.”
A artista acredita que o programa trouxe muita visibilidade para a arte drag nacional. “É muito importante a gente entender que esse momento não é só para mim que venci o ‘Drag Race Brasil’, diz ela.
“Tem um público que consome muito as drags que vêm lá de fora e não tanto as nacionais. O que eu quero nesse momento é também fazer essa roda girar para gente daqui. Para gente mostrar que não tem nada a desejar em relação às drags lá de fora, que a gente é capaz de mostrar para grandes produtores que nós podemos lotar festas, que a gente não precisa ter uma drag lá de fora para ser chamariz. A gente é o chamariz, a gente é o show com drag lá de fora ou sem drag.”
Organzza reforça também que é importante democratizar os espaços onde drags são vistas: “Eu venho do teatro, então quero poder também levar a minha arte para esse espaço, para tirar um pouco essa ideia de que drag é artista que tem que ficar no meio de uma boate, numa madrugada, numa sauna, em lugares escondidos.”
“A gente tem que estar ocupando teatros, ocupando galerias, ocupando espaços onde sejamos tratadas como artistas. E é isso que eu pretendo fazer daqui para frente com essa coroa, com essa projeção, com esse esse holofote em mim, que isso se espalhe para todas as drags, transformistas e artistas da noite, em todos os lugares do nosso país”, finaliza.
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