
A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) protocolou uma denúncia no Ministério Público Federal nesta quarta-feira (16) contra a nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), que impõe restrições ao atendimento médico de pessoas trans. A norma proíbe o uso de bloqueadores hormonais durante a puberdade e eleva a idade para tratamentos como hormonização cruzada e redesignação sexual. A medida foi publicada no Diário Oficial da União.
A Antra também anunciou uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, em conjunto com o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT). O documento é assinado pelos advogados Paulo Iotti e Gisele Szmidt e conta com o apoio de diversas instituições aliadas à causa trans.
A norma do CFM estabelece que apenas pessoas com 18 anos poderão iniciar o processo de hormonização cruzada. Já as cirurgias de redesignação ficam restritas a maiores de 21 anos. A resolução também veta o uso de bloqueadores hormonais para crianças e adolescentes com variações de identidade de gênero.
Segundo o CFM, a medida busca prevenir o aumento de casos de destransição. No entanto, o relator da proposta, Raphael Parente, admitiu a ausência de estudos sólidos sobre o tema. Parente foi secretário do Ministério da Saúde durante o governo Jair Bolsonaro.
O presidente do CFM, José Hiran Gallo, afirmou que médicos que descumprirem a norma poderão sofrer sanções, incluindo advertência, censura, suspensão e até cassação do registro profissional. A decisão foi classificada como técnica e "em defesa da medicina baseada em evidências".
A Antra rebateu o argumento e enviou ao MPF documentos técnicos, incluindo uma nota da Antra Diversidade AC, para demonstrar que a resolução fere direitos fundamentais. A entidade aponta afronta à Constituição Federal e às diretrizes da Organização Mundial da Saúde.
A presidenta da Antra, Bruna Benevides, divulgou pronunciamento oficial ( veja o vídeo a baixo ). “Queremos colocar a nossa inteira solidariedade às nossas crianças e jovens trans”, disse. “Seguiremos firmes na defesa do direito ao acesso à saúde para todas as pessoas.”
No vídeo, Benevides denunciou que a medida atende a uma agenda ideológica. “O Conselho Federal de Medicina, ao tomar uma decisão político-ideológica, tem feito uma caçada aos nossos direitos. E tem por objetivo erradicar pessoas trans da vida pública.”
Ela também criticou o tratamento desigual dado a crianças intersexo. “No mesmo momento em que proíbem o bloqueio puberal para crianças trans, autorizam cirurgias em bebês intersexos. Há uma contradição, o que demonstra o viés ideológico dessa decisão.”
Benevides acusou o CFM de desconsiderar evidências científicas. “É o mesmo órgão que apoiou a autonomia médica para prescrever cloroquina e agora ignora a autonomia no caso de crianças trans. As decisões partem de relatórios anticientíficos já criticados por instituições internacionais.”
A Antra afirmou que continuará mobilizada. “Seguiremos na resistência contra qualquer retrocesso. Crianças trans existem, suas vidas importam, e nós seguiremos aqui para defendê-las sempre que possível.”
O iG Queer entrou em contato com o MPF para comentar o caso, mas ainda não recebeu uma resposta.