STJ decide que Lei Maria da Penha também vale para mulheres trans

Decisão histórica aponta que mulheres trans podem ser enquadradas em medidas protetivas

Mulheres trans devem ter respaldo na Lei Maria da Penha
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Mulheres trans devem ter respaldo na Lei Maria da Penha

Em decisão histórica, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou que a Lei Maria da Penha também pode ser aplicada para mulheres transgênero e travestis. A decisão foi tomada na noite da última terça-feira (5) pela Sexta Turma do STJ. É a primeira vez que o tribunal julga essa questão, o que pode influenciar outras instâncias judiciais.

Os ministros decidiram, em unanimidade, que o artigo 5º da legislação aponta violência familiar e doméstica contra mulheres por conta do gênero, sem identificar questões biológicas. Com isso, foi entendido que qualquer mulher, trans ou cisgênero, que se sentir violada pode recorrer à lei.

A discussão foi realizada a partir de um recurso do Ministério Público que foi contra a aplicação de medidas protetivas para uma mulher trans que foi agredida pelo pai, que não aceitou a identidade de gênero trans. Com isso, a Justiça de São Paulo negou a aplicação.

Durante a sessão, a ministra Laurita Vaz afirmou que tribunais devem separar os conceitos de sexo biológico e identidade de gênero e reforçou que a maioria das mulheres trans e travestis são agredidas por pessoas conhecidas dentro de casa.

“A própria realidade brutal vivenciada pelas mulheres trans nos permite identificar traços comuns com a violência praticada contra as mulheres sui generis. Os atos possuem a mesma origem: a discriminação de gêneros”, frisou.

"Não há razão nenhuma para excluir do acesso à Justiça, à proteção das medidas garantidas da Maria da Penha, as transexuais femininas. A mulher trans, independentemente de terem passado pela cirurgia, devem estar protegidas pela Maria da Penha se a ação decorre da sua condição social”, complementa Raquel Dodge, subprocuradora-geral da República.

O ministro Rogério Schietti reforçou o fato de que o Brasil é o país que mais mata pessoas transgênero no mundo, e que houve 140 assassinatos de pessoas trans no país em 2021. Ele atribuiu as mortes ao "reflexo de uma cultura patriarcal e misógina".

"O dado é preocupante porque reflete comportamento predominante que não aceita identidades outras que aquelas que a nossa cultura e formação nos levou a definir, até por questões religiosas, como identidades relacionadas tão somente ao sexo, característica biológica. O que se discute é a possibilidade de uma lei que veio para proteger a mulher possa também abrigar assim quem se define e se identifica", reforçou o ministro.